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quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Programa na Caatinga promoverá uso florestal sustentável

Desmatamento para fins energéticos é o principal vetor da degradação ambiental e da intensificação do processo de desertificação


Quase 1.500 municípios brasileiros se encontram em processo de desertificação, o que corresponde a 16% da área do território brasileiro. Tal situação desafia os gestores de políticas públicas a promover ações estruturantes para convivência sustentável com a semiaridez e o efetivo combate à desertificação.

Diante deste cenário, foi lançado na última sexta-feira (30), em Campina Grande (PB), um Programa de Segurança Bioenergética Florestal que visa promover a conservação e o uso sustentável da biodiversidade da Caatinga para a sustentabilidade da matriz energética das indústrias cerâmicas.

Pioneiro no Nordeste, o Programa é uma iniciativa do Departamento de Combate à Desertificação do Ministério do Meio Ambiente (DCD/MMA) e será desenvolvido em parceria com o Instituto Interamericano de Cooperação para Agricultura (IICA) e o Parque Tecnológico da Paraíba (PaqTcPB), por meio do Centro de Produção Industrial Sustentável (Cepis), com apoio do Fundo Clima e da Associação dos Ceramistas do Sertão e do Seridó da Paraíba (Solidos), composta por 25 cerâmicas com atuação em 15 municípios do Semiárido paraibano.

Uma das estratégias de ação encontradas pelo DCD/MMA tem sido promover a sustentabilidade da matriz energética, por meio de parcerias com o setor industrial, da promoção da segurança energética domiciliar e do manejo florestal sustentável da Caatinga.

A lenha, recurso florestal nativo, sempre foi a principal fonte de energia do bioma Caatinga, representando cerca de 30% da matriz energética e 40% do parque industrial, sendo que o setor cerâmico representa hoje mais da metade (cerca de 60%) da demanda do setor industrial por lenha no bioma.

Durante o lançamento, o diretor do DCD, Francisco Barreto Campello, destacou que o Programa é emblemático por colocar em evidência o papel do manejo florestal e a importância de trabalhar a questão da melhoria da eficiência energética para o setor cerâmico, com um olhar estratégico para o quadro das mudanças climáticas e o manejo da paisagem. “É um setor que tem uma representação importante no Nordeste em todos os sentidos, principalmente na geração de empregos, e é extremamente relevante trabalhar estas cerâmicas da Paraíba como referência para o cenário do setor industrial da região. Nesse contexto de mudanças climáticas o maior desafio hoje é promover as ações de adaptação, mostrando, por um lado, que a paisagem que está posta vai ser conservada e, por outro, que será mantido dentro do setor uma estratégia para utilizar a lenha, biocombustível renovável e fonte energética mais adaptada que dispomos hoje na Caatinga”, assegura o diretor.

No Brasil e no mundo um dos principais vetores da degradação ambiental e da intensificação do processo de desertificação é o desmatamento para fins energéticos. Por esta razão, o Programa irá investir na qualificação das práticas de manejo florestal, visando uma política florestal sustentável para a convivência com a semiaridez.

“Em 2002 a área desmatada da Caatinga era de 43,38%, enquanto em 2008 era de 45,39%, com perda de cerca de 2% da vegetação nativa durante o período, o que confirma, mais uma vez, que não existe uma frente de desmatamento na Caatinga, mas práticas de manejo por meio do sistema de rodízio para descanso do solo, conhecido localmente como pousio. Isso tem que ser inserido nas políticas públicas para que possamos de fato dispor de uma forma diferente de trabalhar promovendo a conservação da biodiversidade, o ordenamento dos recursos florestais, o incremento na economia local e a sustentabilidade da matriz energética por meio do uso de biocombustível renovável e local, que é a lenha”, completou Campello.

Estima-se que a demanda atual de lenha por parte das indústrias e comércio da região seja mais de 25 milhões de metros ésteres ano. A área potencial de uso sustentável disponível é de cerca de 6 milhões de hectares com cobertura vegetal passível de manejo florestal, sendo que para atender a demanda do Nordeste é necessário apenas 2,5 milhões de hectares, o que corresponde a 7% da área remanescente florestal da Caatinga. “Ainda não existe ameaça, temos áreas suficientes para utilizar, capaz de atender a demanda, o problema é que não estamos sabendo aproveitar este potencial”, ressaltou Campello. Os dados são de estudo do Fundo para o Meio Ambiente Global (GEF), realizado em 2010.

Novos paradigmas

Na busca de promover alternativas de sustentabilidade ambiental e socioeconômica do bioma Caatinga, o Programa irá estruturar estratégias de comunicação com o objetivo de sensibilizar a sociedade e produtores para dar visibilidade ao conjunto das atividades sustentáveis a serem implantadas. Também utilizará estratégias de extensão rural, com mobilização de um quadro técnico especifico para sensibilizar, orientar e cadastrar os produtores rurais para as práticas florestais (manejo e plantios) e implantação das Áreas Protegidas.

Estas ações serão importantes em razão da necessidade de romper com paradigmas extremamente consolidados na sociedade contra o uso do potencial da biodiversidade florestal. É muito comum encontrar visões preconcebidas que associam certas atividades produtivas de exploração de recursos ambientais necessariamente como ações de degradação.

No entanto, muitas vezes se tratam de produtores que valorizam e utilizam o potencial da biodiversidade do espaço semiárido, com um plano de manejo aprovado, licenciado e acompanhado pelo órgão ambiental, que promovem a conservação das florestas, mas que são equivocadamente marginalizados pela sociedade. Assim, a necessidade de mudança de paradigmas foi apontada como um dos grandes desafios a serem superados durante a implantação do Programa.

Tais preconceitos também se refletem no âmbito das relações institucionais e nas ações de fomento e crédito para a biodiversidade florestal. Existe certa marginalização da presença da lenha na matriz energética, que tem focado seu planejamento estratégico muito mais na preocupação de encontrar fontes energéticas alternativas (eólica, solar, etc), ao invés de também qualificar a biomassa florestal como atividade importante de sua política.

Os bioenergéticos florestais são economicamente viáveis pelo seu baixo custo e, se utilizados de forma sustentável com melhoria dos processos e adaptação de inovações tecnológicas, podem contribuir para a inclusão social, para valorizar os recursos ambientais e para diminuir a vulnerabilidade regional frente às mudanças climáticas.

O Presidente da Solidos-PB, Gideão Tibúrcio dos Santos, ressaltou que o grupo de ceramistas tentava e vem tentando legalizar 100% de suas ações e sempre havia empecilhos, mas acredita que essas novas parcerias irão ajudar a desmitificar o problema que sempre enfrentaram.

O fundador da Associação, José Moura Filho, complementou: “nosso ramo não é uma atividade ilegal, antes nós nos sentíamos marginalizados por conta que usávamos diretamente o meio ambiente, como o barro, a argila e a lenha. Hoje com as formas de sustentabilidade que o Programa vem nos mostrando, a gente começa a entender que saímos dessa área da marginalização para uma margem de reconhecimento, porque o crescimento do nosso estado e do nosso país se dá mediante a necessidade de construção de habitações que exige do mercado a fabricação de telhas e tijolos que têm como principal matéria-prima o barro e a lenha, desde que este insumo seja utilizado de forma racional e sustentável”.

Neste sentido, o entendimento da gestão do Programa é que para a mudança de paradigmas é necessário que as práticas de utilização sustentável dos sistemas agroflorestais da Caatinga sejam legalizadas, por meio do fortalecimento do diálogo entre órgãos ambientais e usuários do meio ambiente.

Outros comportamentos institucionais importantes são: fortalecer o processo de descentralização da gestão florestal; promoção do uso sustentável pelas linhas de crédito e utilização das estratégias de comunicação para implantar os sistemas de manejo adequado como instrumento de gestão ambiental.

O projeto será executado a partir deste mês e é coordenado pela pesquisadora Aluzilda Oliveira, do Cepis/PaqTcPB, Agência Implementadora do MMA.

Fonte: EcoDebate

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