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terça-feira, 13 de outubro de 2015

Sistema Cantareira sofreu transição catastrófica em 2014

As represas do sistema Cantareira sofreram uma transição catastrófica em janeiro de 2014, quando passaram rapidamente de condições normais para um estado de ineficiência. A avaliação é baseada em dados sobre os reservatórios, métodos estatísticos e modelagem matemática, e foi feita em estudo dos pesquisadores Paulo Inácio Prado, professor do Instituto de Biociências (IB) da USP, e Renato Mendes Coutinho e Roberto Krankel, da Universidade Estadual Paulista (Unesp). De acordo com o trabalho, ações que poderiam deter a transição deveriam ter sido tomadas antes de 2014.

A pesquisa é descrita em artigo da revista científica PLoS ONE. O motor da transição é o que é chamado popularmente de “efeito esponja”. Em situação de normalidade, há muita água no reservatório e na bacia hidrográfica. Boa parte da água da chuva vai para os reservatórios, mantendo o sistema no estado normal. Isto resulta em um círculo virtuoso.

Já numa situação de seca, o volume do sistema é mais baixo e o solo absorve mais da água que iria para o reservatório, o que faz o seu nível baixar mais ainda. Neste caso, há um círculo vicioso. A passagem do círculo virtuoso ao vicioso é uma transição que acontece em poucos meses. Para evitá-la é preciso monitorar o sistema e retirar menos água quando houver o risco de transição.

O professor Prado aponta que no Cantareira a eficiência do sistema caiu muito. “Esta eficiência é a relação entre a chuva que cai e a quantidade de água que vai para os reservatórios”, ressalta. “E ela continua baixa mesmo com as chuvas voltando à normalidade, o que indica que o sistema mudou de regime”.

Sinais de transição
Outra evidência da perda de eficiência são sinais estatísticos de transição nas variações diárias de volume. “Há várias técnicas que detectam estes sinais, e eles são inequívocos para o sistema Cantareira”, aponta Prado. “Além disso, o grupo de pesquisa desenvolveu um modelo matemático para descrever a transição, que se ajusta muito bem aos dados de volume e vazões observados”. Por meio desse modelo são feitas projeções para os próximos 30 dias, publicadas diariamente no site Águas Futuras desde o último mês de abril.

Os pesquisadores estimam que a transição no Cantareira ocorreu entre novembro de 2013 e janeiro de 2014, indicada pela queda abrupta da eficiência do sistema e os sinais estatísticos de transição. Transições críticas não são novidade para cientistas, que as associam ao conceito de resiliência. Intuitivamente, resiliência é a capacidade de um sistema de voltar ao mesmo estado depois de ter sido perturbado. Alguns casos de perda de resiliência na natureza são bem estudados, como o processo de desertificação.

O trabalho mostra que a perda de resiliência também pode ocorrer em reservatórios de água, como no sistema Cantareira. “O artigo analisa o caso da Cantareira como um exemplo de biestabilidade. É um conceito da física para descrever sistemas que têm mais de um estado possível. É o caso de um barco na água, que em condições normais não vira com a ação das ondas ou do vento. Este é um estado resiliente”, explica o professor. “O problema é que se uma força grande o suficiente virar o barco, ele passa a um novo estado que também é resiliente — é preciso um grande esforço para desvirá-lo”.

De acordo com Prado, a Cantareira sofreu uma força grande o suficiente para mudar de estado, e agora resiste para voltar à condição normal. “O empurrão foi manter a retirada de água em níveis de anos normais em um ano de chuvas anormalmente baixas”, ressalta. “Não é possível controlar a chuva, mas uma redução mais precoce da retirada de água poderia ter evitado a transição”. O pesquisador propõe reduzir a retirada ao mínimo possível, e a médio prazo, se o sistema se recuperar, realizar uma gestão mais cautelosa, devido ao risco adicional de transições.

Os resultados da pesquisa mostram que o gerenciamento de um reservatório deve levar em conta a possibilidade de transições catastróficas. O padrão anteriormente utilizado, baseado na chamada “curva de aversão ao risco”, indicava uma situação de normalidade até dezembro de 2013, o que o artigo mostra que não era real. “Isto quer dizer que é necessário definir novos parâmetros de operação a partir de conhecimentos científicos atuais”, conclui Prado.

Fonte: EcoDebate

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