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segunda-feira, 7 de abril de 2014

USP quer usar DNA de verme em planta para torná-la resistente à seca

Desenvolver plantas capazes de resistir a longos e críticos períodos de seca, ou mesmo com baixo volume de irrigação. Esse é o objetivo de uma pesquisa do Departamento de Biologia da Universidade de São Paulo (USP), em Ribeirão Preto (SP), que estuda o DNA de vermes anidrobióticos – capacidade de sobreviver sem água. A proposta dos pesquisadores é identificar os genes responsáveis por desencadear a anidrobiose e, por meio de engenharia genética, criar plantas transgênicas super resistentes ao calor e ao tempo seco.

O projeto é desenvolvido há quatro anos em parceria com a Universidade Nacional da Irlanda e a Universidade de Cambridge, na Inglaterra. A pesquisadora Cláudia Carolina Evangelista, de 24 anos, explica que cada verme possui cerca de 20 mil genes e, pelo menos, uma centena deles é responsável pela sobrevivência sem água. Até agora, 35 já foram identificados pelo grupo brasileiro.

“Se expostos a ambientes muito secos, esses organismos iniciam uma resposta molecular e ficam como se fossem cristalizados, ou seja, eles perdem a água do corpo e começam a acumular açucares, proteínas que formam uma espécie de vidro e que servem de proteção. Parece que está morto, mas não está, sobrevivem por muito tempo na seca”, afirma Cláudia.

Dados da Organização das Nações Unidas (ONU) apontam que, em 2013, o Brasil enfrentou a pior seca registrada nos últimos 50 anos, superando até 2012, que também já havia batido seu recorde. O primeiro trimestre de 2014 sinaliza que a falta de chuvas deve continuar em boa parte do país: o último verão em São Paulo foi o mais quente desde 1943, quando começaram as medições.

Além disso, ainda segundo a ONU, 72% de toda a água disponível no país é utilizada na irrigação de lavouras – a área irrigável é de aproximadamente 29,6 milhões de hectares. Neste aspecto, Cláudia explica que seria possível, por meio da anidrobiose, redirecionar os recursos hídricos destinados às lavouras comerciais, para o uso humano ou para a geração de energia. “As plantas ficariam estáveis por tempo indeterminado.”

Aplicação prática – O orientador da pesquisa no Brasil, o biólogo Tiago Campos Pereira, afirma que, uma vez descobertos todos os genes responsáveis pela anidrobiose, o método pode ser transferido para plantas por meio de engenharia genética, aplicando em culturas como milho, feijão, café e cana-de-açúcar, por exemplo. As plantas transgênicas sobreviveriam por longos períodos, até mesmo décadas, sem chuvas ou irrigação. “Só não funcionaria em plantas que têm muita água, como a melancia. Nesse caso, é inviável.”

Outra possibilidade de criação das plantas transgênicas, fora dos laboratórios, é a criação de um composto mineral, uma solução que seria pulverizada nas plantações e, penetrando nas plantas, permitiria a cristalização. “Mas essa opção é mais especulativa, porque exige uma pesquisa mais avançada”, afirma o pesquisador, destacando que o estudo deve ser finalizado em cinco anos.

Segundo Pereira, já existem empresas europeias aplicando esse princípio em vacinas. O medicamento é desidratado em uma matriz cristalizada, semelhante a um papel, sem necessidade de refrigeração. Quando chega ao destino, essas membranas são acopladas a uma seringa, recebem soro fisiológico e podem ser utilizadas normalmente.

“É possível ir além: identificados todos os genes conseguiremos, através da engenharia anidrobiótica, preservar órgãos humanos, cristalizá-los e mantê-los em estado de suspensão, possibilitando mais tempo para encontrar doadores, em caso de transplantes. Seria um avanço na medicina”, afirma Pereira.

Solução no campo – Apesar de a aplicação prática da tecnologia anidrobiótica ainda parecer tema de literatura de ficção científica, o cafeicultor José Ricardo Cunha, de 41 anos, não descarta que a técnica possa ajudar a “salvar” a lavoura. Terceira geração da família na cafeicultura, Cunha afirma nunca ter vivido um período de escassez de chuva tão prolongado nos primeiros meses do ano, como em 2014.

As altas temperaturas e o clima seco prejudicaram os 200 mil hectares da propriedade, em Ribeirão Corrente (SP), fazendo com que a expectativa de colheita fosse reduzida em até 60%. “Afetou até a próxima safra, porque os pés de café não cresceram. Agora, não tem o que ser feito”, afirma Cunha, dizendo-se surpreso com a técnica proposta pelos pesquisadores da USP.

“Os produtores tem medo de apostar. A gente diz que a melhor variedade é aquela que se constrói dentro da fazenda. Eu tenho a mente mais aberta, mas confesso que nunca pensei nessa possibilidade. É interessante.”

Fonte: G1

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