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segunda-feira, 13 de julho de 2015

Incompetência e ganância nas terras da Amazônia

O caderno especial do Jornal O Estado de S. Paulo Favela Amazônia – um novo retrato da floresta (5/7), coordenado por Leonencio Nossa – é documento que precisa ser conhecido por todos.  
É, ao mesmo tempo, um retrato da devastação no bioma amazônico e um libelo sobre os formatos impiedosos da atuação humana naquela parte do nosso território – e suas consequências dramáticas internamente e para o inquietante drama do clima. Que se pode dizer quando se tem diante dos olhos os números – um terço da população das grandes e médias cidades vivendo em “territórios do tráfico”, condições mais desfavoráveis que a das favelas do Rio e de São Paulo, máfias controlando o programa Bolsa Família? Onde a biodiversidade – alto privilégio para o País – vai sendo perdida em alta velocidade?

A geografia política deu ao Brasil condição excepcional: território continental, sol o ano todo, quase 12% de toda a água superficial do planeta, pelo menos 15% da biodiversidade total, possibilidade de matriz energética limpa e renovável num mundo em crise por causa das emissões de poluentes. Mas vamos desperdiçando tudo, por incompetência e ganância.

Ainda há poucas semanas o Brasil prometeu (Estado, 1.º/7), em declaração conjunta com os Estados Unidos, restaurar e reflorestar 12 milhões de hectares de florestas e acabar com o desmatamento ilegal “até 2030”; da mesma forma, comprometeu-se a aumentar em 20% as fontes internas de energias renováveis, até 2030 – meta que o professor José Goldemberg achou “pouco ambiciosa”. O Observatório do Clima (1.º/7) considerou insuficientes os objetivos. Quando nada, porque a demanda de energia vai crescer 70% em 15 anos; e as emissões setoriais devem chegar a 800 milhões de toneladas de carbono equivalentes em 2030.

Várias instituições continuam a prever que os níveis de desmatamento em 2015 devem superar os do período anterior. Ainda assim, o governo federal cortou em 72% os recursos contra o desmatamento na Amazônia, de R$ 6,36 bilhões para R$ 1,78 bilhão (amazonia.org 1/4).

Quando se vai para o capítulo de projetos de hidrelétricas na Amazônia, a inquietação só pode crescer. Dossiê do Instituto SocioAmbiental (ISA) sobre o projeto da hidrelétrica de Belo Monte (29/6) traz uma síntese de erros e omissões que ali estão sendo cometidos; 24 especialistas condenam o que está acontecendo na área – inclusive desmatamento e exploração ilegais de madeira, destruição das atividades pesqueiras, perda do modo de vida tradicional nas comunidades removidas, perda da biodiversidade nas ilhas formadas no reservatório, ameaças a comunidades indígenas. A mortalidade infantil cresceu 127% entre 2010 e 2012.

Em Altamira já foi feita a demolição de 4 mil casas e barracos para abrir espaço para o lago; 7,8 mil famílias, com 27 mil pessoas, tiveram de ser reassentadas. Ainda assim, não se conseguiu ligar a primeira turbina em fevereiro, como estava previsto – “parece um cenário de guerra”, dizem os críticos.

A cidade, que em 2010 tinha 100 mil habitantes, passou para 150 mil com o projeto da hidrelétrica (Estado, 28/6), no valor de R$ 32 bilhões, que prometia saneamento básico para 10% da população – mas não saiu do papel; 2 mil processos estão em andamento na área, onde trabalham 24 mil pessoas (40 mil com os empregos indiretos).

Mais complicado ainda parece o destino de outro projeto, em Itaituba: o da usina São Luiz do Tapajós, no valor de R$ 30 bilhões, que já nem se sabe se se concretizará, dados o envolvimento na Operação Lava Jato e as conclusões de 20 mil páginas de estudos de técnicos ambientais sobre os prováveis impactos da planejada “usina plataforma” de 8 mil MW. A Eletrobrás nega haver falhas no projeto, mas o próprio presidente da Empresa de Pesquisa Energética, Maurício Tolmasquim, admite que “há riscos”, até porque surgiram problemas complicados com áreas indígenas – que ele espera resolver com consultas aos grupos que se acham prejudicados, como exige a Justiça (amazonia.org 18/6).

Segundo o Greenpeace (Eco 21, maio 2015), 19% da floresta amazônica foi removido em 19 anos – o que é extremamente grave, porque a Amazônia “transpira” diariamente para a atmosfera 20 bilhões de toneladas de vapor d’água e isso tem influência decisiva no clima e no regime hídrico de outras regiões, principalmente no Centro-Oeste e no Sudeste, por causa dos “rios voadores”.

Ainda assim, lembra o Instituto Centro de Vida do Cerrado (8/6) que 46% da área florestal explorada em Mato Grosso num período de ano ocorreu ilegalmente – 139 mil hectares ou 31% mais que no período anterior, afetando também áreas indígenas, para retirar 3 milhões de metros cúbicos de madeira.

E ainda é preciso lembrar que metade do carbono que as árvores amazônicas capturam da atmosfera é aprisionada por apenas 1% das espécies da floresta, segundo estudo da Universidade de Leeds, no Reino Unido (ambientebrasil, 15/5). A Amazônia tem 16 mil espécies de árvores, mas apenas 182 dominam o processo de captura de gases que afetam o efeito estufa. O bioma responde por 14% do carbono assimilado pela fotossíntese e abriga 17% de todo o carbono estocado em vegetação no planeta.

Não pode deixar de preocupar saber (amazonia.org, julho 2015) que pelo menos 70% das espécies selvagens nas 3.456 ilhas formadas pelo lago da hidrelétrica de Balbina (2,36 mil km2) “estão condenadas à extinção”, segundo estudo da bióloga Maíra Benchimol. E isso terá fortes repercussões.

É possível, então, reiterar as observações do pesquisador Antônio Donato Nobre, do Inpe e do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Eco 21, dezembro de 2014): “O grande responsável por manter o clima ameno no coração do continente sul-americano é a floresta amazônica”. Mas “ela está sendo destruída”, com 726.979 km2 já removidos , chegando a 2.062.914 km2 com o acréscimo da degradação em outras áreas.

* Washington Novaes é jornalista.

Fonte: Envolverde

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