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segunda-feira, 17 de junho de 2013

Pesquisador defende moratória de cinco anos para a exploração do gás de xisto

Muitos creditam a retomada do crescimento econômico nos Estados Unidos ao aumento do uso de uma fonte de energia barata: o gás de xisto. Porém, mesmo entre os norte-americanos existem divergências sobre os reais impactos para o meio ambiente e para a saúde humana resultantes da exploração desse recurso.
O governo brasileiro já manifestou a intenção de incluir o gás de xisto na matriz energética do país, sendo que o primeiro leilão de licitação para áreas de exploração está agendado para o final deste ano.

Para o pesquisador Luiz Fernando Scheibe, doutor em Ciências (Mineralogia e Petrologia) da Universidade de São Paulo (USP), Professor Emérito da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e Coordenador da REDE GUARANI/SERRA GERAL, ainda sabemos muito pouco para podermos explorar com segurança o gás de xisto.

Na entrevista a seguir, Scheibe aponta os riscos dessa atividade para o Aquífero Guarani e defende uma moratória de cinco anos para “aprofundar o conhecimento dessas reservas, bem como os estudos sobre os reais prejuízos ambientais dessa perigosa técnica.”

Instituto CarbonoBrasil - O senhor é um duro crítico do uso do gás de xisto apesar de essa fonte ser um dos fatores por trás da aparente recuperação econômica dos EUA nos últimos anos. Por que o Brasil não pode usufruir das reservas que possui? Os impactos de explorar o gás de xisto aqui são piores do que nos EUA?

Luiz Fernando Scheibe – No Brasil, a produção de gás natural é um componente importante e crescente da matriz energética, graças às descobertas de novos campos. O Plano Decenal de Expansão de Energia – PDE 2012—2021, lançado em janeiro, procura tirar partido da abundância de petróleo e gás natural. Ele prevê que haverá “ampliação da produção de petróleo de 2,1 para 5,4 milhões de barris/dia e da produção de gás natural, de 65,9 milhões para 190 milhões de m³/dia”, e que o consumo total de gás natural será da ordem de 65,9 milhões de m³/dia,ou seja, apenas 1/3 da produção daquele ano, ou seja, há reservas abundantes de gás natural: por que buscar o polêmico e perigoso gás de xisto? Por outro lado, em palestra apresentada dia 12 de junho ao CEDES – Centro de Estudos e Debates Estratégicos da Câmara Federal – (disponível aqui), a Diretora-Geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), Magda Chambriard, ressaltou a necessidade de aprofundamento no conhecimento geológico dos folhelhos [rocha sedimentar] brasileiros geradores de petróleo e gás antes de licitar quaisquer áreas para exploração do “Gás de Xisto”, sendo os cálculos atuais de reservas ainda muito preliminares.
Existem muitos relatos de experiências desastrosas causadas pela exploração do gás de xisto nos EUA, e isso aponta para a necessidade de uma rígida normatização e controle dessa atividade antes de sua eventual liberação no Brasil.

ICBr - Qual é a ameaça para os aquíferos, em especial para o Guarani?

LFS – A tecnologia de extração do Gás de Xisto por Fraturamento (shale gas fracking) consiste em processos invasivos da camada geológica portadora do gás, por meio da técnica de fratura hidráulica, com explosões e a injeção de água, areia e substâncias químicas sob altíssima pressão, podendo ocasionar vazamentos na superfície e contaminação de aquíferos de água doce que ocorrem acima do xisto.

Essa é uma grande preocupação dos técnicos e gestores da área de recursos hídricos. Maior ainda é a preocupação com os milhões de litros de água que resultam poluídos em cada poço, por hidrocarbonetos e por outros compostos e metais presentes na rocha, nos explosivos e nos próprios aditivos químicos requeridos pela complexa atividade de mineração do gás, exigindo dispendiosas técnicas de purificação e de descarte dos resíduos finais, que podem vir a poluir tanto a água de superfície como os próprios aquíferos.

A revista Waterworld, mantida pelas grandes empresas internacionais de tratamento de água, comemora a existência de um mercado crescente, com valor estimado de US$ 100 bilhões, só nos Estados Unidos, para o tratamento das águas residuais desse processo. Isso mostra como o PIB pode aumentar duplamente com este tipo de atividade, primeiro acumulando com a exploração do gás e poluição da água, e depois ganhando novamente, na tentativa de reparar os danos ambientais dela resultantes, fazendo com que o triângulo da sustentabilidade, que envolve sociedade, meio ambiente e economia, penda apenas para o último vértice em detrimento dos demais, que julgo serem mais importantes.

Entendemos que as águas subterrâneas podem ser melhor aproveitadas por setores da indústria e do abastecimento público, principalmente na bacia do Paraná, onde se encontra o Aquífero Guarani, pois essa é uma bacia hidrográfica muito industrializada, que por sua vez contribui muito para o PIB nacional. Nesse caso, é mais interessante manter as reservas subterrâneas de água que possibilitam o desenvolvimento de cidades assentadas sobre a bacia, fixando a população que participa desse desenvolvimento econômico. É importante lembrar que esse intenso desenvolvimento econômico em superfície contribuiu para a deterioração da qualidade das águas dos rios da bacia do Rio Paraná, fazendo com que cerca de 80% dos municípios nela inseridos busquem nas águas subterrâneas sua fonte de abastecimento.

No caso da Bacia do Paraná, a rocha geradora de petróleo e gás é o Folhelho Irati (o “Xisto Betuminoso”), de idade Permiana e situado estratigraficamente abaixo do Arenito Botucatu, de idade Triássica, que constitui o Aquífero Guarani, e das rochas vulcânicas da Formação Serra Geral (Juro-Cretácica) que constituem o Aquífero Serra Geral, também de extrema importância em toda a região norte-noroeste do Rio Grande do Sul e oeste de Santa Catarina e do Paraná, especialmente para o abastecimento público.

Existem claras evidências de interconexão entre esses dois importantes aquíferos, a ponto de se propor, para fins de gestão, que sejam considerados como um único sistema, o “Sistema Aquífero Integrado Guarani/Serra Geral” (SAIG/SG), bem como da penetração, neste, de águas sulfatadas advindas dos estratos inferiores do Permiano que se infiltram no SAG, como as águas termais no vale do rio Uruguai, no limite entre RS e SC, além da presença de óleo antigo em fraturas do sistema Aquífero Serra Geral nos municípios de Videira e Pinheiro Preto, em SC. Daí o temor de que esses processos possam ser potencializados ou até reativados pelas explosões e elevadas pressões hidrostáticas empregadas no processo de extração do gás de xisto.

ICBRr- A presidenta Dilma Rousseff afirmou recentemente que se “continuarmos a fazer hidrelétricas a fio d’água e a ter toda a arquitetura de energia renovável como temos, haverá uma necessidade das térmicas na nossa matriz”. Se é mesmo inevitável “sujar” a matriz, o gás de xisto não é uma melhor opção do que o carvão?

LFS – Ao mencionar “a arquitetura de energia renovável como temos”, creio que fica explícita a possibilidade de implementação de um complexo de geração de energias renováveis muito mais completo e abrangente do que este de que dispomos atualmente. Por outro lado, a recente licitação de novas áreas para exploração de gás e especialmente aquelas previstas para exploração de gás “convencional” em terra firme (onshore) numa 12ª Rodada de Licitações prevista agora pela ANP para novembro, além da perspectiva de grande ampliação da produção de gás a partir do Pré-Sal, poderá atender, ainda por muitos anos, as necessidades energéticas do País – sem uso do gás de xisto e sem ampliação ou construção de novas termelétricas a carvão.

ICBr - Esse leilão da ANP deveria ser suspenso?

LFS – Em sua exposição, a Diretora-Geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), Magda Chambriard, afirmou que, na 12ª Rodada de Licitações prevista agora pela ANP para novembro, serão licitados “de preferência” apenas prospectos de gás natural “convencional”, sendo que das concessionárias será exigido que aprofundem alguns de seus poços, para atingir a camada de rocha geradora (o “xisto”) e façam análise de suas características, para aumentar o conhecimento do real potencial de produção desse tipo de rocha. O que podemos, portanto, solicitar é que a expressão “de preferência” seja substituída por “exclusivamente”, fazendo com que a eventual mudança de tipo de exploração para o uso de fracking venha a depender de nova licitação específica, quando e se já houver consenso entre governo, empresas e a comunidade científica brasileira sobre as reais possibilidades de utilização dessa técnica sem riscos ambientais, o que não é hoje o caso.

ICBr- Levando em consideração os interesses econômicos envolvidos, o senhor considera possível evitar que o Brasil explore o gás?

LFS – No que afirma ser “apenas um exercício, sem maior credibilidade”, a mesma Diretora-Geral da ANP informou que as reservas brasileiras de gás de xisto a serem recuperadas por fraturamento poderiam atingir quase 500 TCF (trilhões de pés cúbicos) – o que representaria praticamente dois terços das reservas dos EUA -, e que esse cenário torna obrigatória a pesquisa para o aproveitamento deste potencial. Afirmou literalmente, contudo, que “neste momento, qualquer coisa que acene com o gás ‘não convencional’ como uma realidade, não é possível”. Essas constatações reforçam a necessidade de que seja estabelecida uma moratória de cinco anos, para aprofundar o conhecimento dessas reservas, bem como os estudos sobre os reais prejuízos ambientais dessa perigosa técnica, que deverão envolver a participação de cientistas da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e das Universidades, antes de se embarcar numa aventura de consequências imprevisíveis, especialmente sobre o Sistema Aquífero Guarani e demais grandes aquíferos e mananciais brasileiros.

(AGRADECIMENTOS são devidos ao CEDES, pelo honroso convite; à Rede Guarani/Serra Geral, Convênio 16261/10-2 FAPEU/FAPESC; a Luciano A. Henning, Gerôncio Rocha, Ricardo Hirata, Arthur S. Nanni e Ruy Ávila Wolff, pelas contribuições e críticas; ao CNPq, pela bolsa de produtividade de Luiz Fernando Scheibe).

Fonte: Mercado Ético

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