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quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Seminário regional debateu sobre impactos ambientais e sociais dos parques de energia eólica no Nordeste

Fortes relatos de quem sente na pele todas as consequências da instalação dos parques eólicos nos seus territórios de origem e a certeza de não ser viável esse modelo de geração de energia, marcaram o Seminário sobre os impactos ambientais e sociais dos parques eólicos no Nordeste brasileiro.
O evento reuniu de 22 a 24 de setembro deste ano, em Juazeiro – BA, cerca de 50 pessoas impactadas pela instalação destes parques, assessores, pesquisadores, estudantes, lideranças comunitárias e representantes de entidades de apoios a organizações e movimentos sociais dos estados da Bahia, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Ceará.

O evento teve o objetivo de garantir uma troca de experiências e de articular as comunidades que estão sendo ameaçadas por estes empreendimentos. A intenção é que estas se fortaleçam e agreguem mais força na resistência em torno do avanço de projetos de desenvolvimento nas comunidades rurais, ribeirinhas e litorâneas.

Reunidos por estado, os/as participantes socializaram quais os impactos que estão sofrendo e quais as experiências de resistências frente à entrada dos parques eólicos nos territórios dos povos tradicionais e originários por todo o Nordeste. “O território é sagrado”, diz um dos participantes sobre o pertencimento das pessoas com o seu local de socialização, produção econômica, social e cultural e também da sua relação com a natureza.

Um dos questionamentos levantado se refere, principalmente, a matriz energética brasileira que ignora os modos de vida, as desigualdades sociais e explora, em grande escala, os recursos naturais, sendo que ainda é chamada de energia limpa. Porém, para os/as atingidos/as e especialistas no assunto, estes modelos de geração de energia – que promovem uma lógica socioambiental injusta onde as empresas ganham e as populações e o meio ambiente perdem, gerando diversas consequências, muitas vezes, irreversíveis – não podem ser chamadas de limpa. “Muito se tem dito que esta é uma energia limpa, porém ela tem gerado sérios danos nas comunidades, que não são ditos, são invizibilizados. Impacta na existência das comunidades”, denuncia Nonato Filho, do Conselho Pastoral de Pescadores, do Ceará (CPP).

Entre os argumentos contrários aos parques eólicos estão os prejuízos ambientais, culturais e sociais para a sociedade. Desmatamento, grilagem, destruição de habitat de diversas espécies de animais nativos selvagens, mudança (brutas) nos modos de produção e vida das comunidades, cerceamento do direito de ir e vir dos povos no próprio território, populações expulsas das suas localidades, mudanças no vento, são alguns dos impactos sofridos pelas comunidades. “Não é só uma leitura do impacto ambiental e econômico, mas do ponto de vista da nossa existência”, argumenta Nonato sobre o evento. Ele explica ainda que a implementação da matriz energética brasileira também contribui para o empobrecimento das populações, “pois ela tem seu território fatiado e privatizado. Muda toda a relação com o território. Tem mais perca do que ganho. Essa energia é pra que e pra quem? Os mecanismos são muito sujos, inclusive de sangue”, afirma Nonato.

Marina Rocha, da Comissão Pastoral da Terra de Juazeiro, esclarece que um evento como este também serve de alerta para que a sociedade entenda que estas comunidades não são as únicas afetadas por estes grandes projetos, mas toda a sociedade. “Quando a comunidade sai do seu território não está prejudicando só a sua comunidade, pois ela produz alimento [na terra] e ainda preserva a natureza, isso tem haver com a sociedade… uma comunidade sem território, não tem vida”, pontuou Marina.

Outro impacto desconhecido pela sociedade é a destruição das nascentes. Com a instalação dos parques nas serras, o desmatamento e a devastação da Caatinga no entorno das torres, as nascentes desapareceram, gerando um desequilíbrio ambiental. Para Rizoneide Gomes, do CPP, a sociedade no geral não conhece esses impactos e o desafio é levar estas informações e conscientizar toda a sociedade de que “esse tipo de energia é como os outros, concentrado nas mãos de pequenos grupos”, avalia.

Realidades alteradas

O que também inquieta as comunidades é a facilidade que estas empresas tem em acessar a documentação de terras que pretendem ocupar, que são, na maioria das vezes, originárias de grilagem. Portanto, as comunidades estão vivenciando, além dos conflitos ambientais, os conflitos jurídicos. Nonato argumenta que na cartografia apresentada por estas empresas, as comunidades são invisibilizadas, desconsideradas como pertencentes ao local.

Elencaram também que um grave problema é o encantamento existente por conta das promessas das empresas ao afirmar que o empreendimento na comunidade iria gerar renda local e melhorar a qualidade de vida. O que nunca aconteceu na comunidade de Dona Maria Nazaré dos Santos, Canavieira, em Aaracati – CE, que tem um parque eólico em toda a sua extensão. Ela diz, que dos nove filhos que tem, nenhum deles teve sua renda gerada a partir da instalação dos parques. A comunitária também citou diversos transtornos e desconfortos provocados pelo fluxo intenso de caçambas atravessando a comunidade, principalmente, no período da implantação das torres.

Mas o que mais impactou a vida das famílias da comunidade de Canavieira foi a retirada do direito de ir e vir da população local pelo seu próprio território e também a negação do acesso aos locais de lazer comunitário, como a região das dunas e a lagoa. “Melhor que ela [empresa de eólica] não existisse, para nós era bem melhor, pois só assim a gente teria o nosso território livre, para ir e vir a hora que a gente quisesse, hoje ninguém pode”, desabafa Maria.

Na avaliação de todos/as, os impactos apresentados pelos participantes foram diversos e se ampliavam na medida que se tinha uma visão minuciosa da instalação dos parques por todo o Nordeste. Do litoral ao sertão, os problemas decorrentes destes grandes empreendimentos só avançam. No litoral do Ceará houve aterramento de lagoas, uso em excesso da água, privatização da terra, aumento do custo de vida da comunidade, a ilusão de compensação, impacto da estrutura das habitações populares. “Se fosse tão bom [o parque], não teria tanta coisa escondida que a comunidade não precisa saber”, comenta uma das participantes, que prefere não se identificar.

No interior do Estado da Bahia, no território Sertão do São Francisco, seu Antônio Santos, que é de comunidade de Fundo de pasto, relata que a economia local das famílias oriunda da criação de caprinos e ovinos tem sido afetada com a chegada dos parques, que está na fase de avaliação e teste. “Proibição da gente transitar na área dos parques eólicos, onde criadores criavam sem problemas, onde tinham aguadas e foram ‘secadas’ devido ao parque eólico”. Ele faz um apelo aos poderes públicos no tocante a entender que o modo de vida desta família é no campo: “observem a nossa Convivência com o Semiárido porque nenhum de nós, que vive no Fundo de Pasto, tem condições de viver na cidade sem emprego”, apela seu Antônio, que é dos que foram atingidos pela construção da barragem de Sobradinho.

Uma realidade contada também é com a desigualdade na negociação da implantação do parque, de um lado quem tem o poder com seus interesses privados, favorecimento político e domínio do conhecimento e do outro as famílias que terão seus territórios desmatados, cortados. A primeira vai ganhar e a segunda vai perder, avaliam os/as participantes.

Neste cenário de expansão dos parques eólicos, a perspectiva de uma matriz energética é a da apropriação dos recursos naturais para a geração do lucro, passando por cima da dinâmica social e existência das comunidades. O Seminário foi organizado pela CPT – BA, CPP Nordeste, Irpaa, Instituto Terra Mar – CE e contou com o apoio da Cese.

Texto e fotos: Comunicação Irpaa

Fonte: EcoDebate

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