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quinta-feira, 12 de setembro de 2013
Erros (ou incompetência) no setor elétrico que custam caro, artigo de Heitor Scalambrini Costa
A população brasileira tem sofrido agruras sem fim devido às falhas recorrentes no setor elétrico, com as interrupções no fornecimento de energia. Tal situação já faz parte do calendário nacional, e têm gerado junto à população em geral, e em setores da economia, a insatisfação crônica, a falta de credibilidade, e a constatação de uma vulnerabilidade inaceitável neste setor essencial e estratégico para o país.
Além desta situação de instabilidade persistente, temos ainda que arcar com o alto custo da tarifa elétrica, que assola os consumidores. A tentativa de redução de tarifas, através de uma ação mal conduzida e autoritária (comum às decisões do setor), restou apenas à propaganda governamental com toda pompa e esplendor produzido pelo marketing político, sem os resultados concretos anunciados.
Não caberia neste singelo artigo de opinião, relatar as inúmeras “atrapalhadas” comandadas pelos sábios e “experts” de um setor, que se caracteriza pela falta de transparência.
Para citar apenas três situações esdrúxulas causadas pelos erros e/ou incompetência, vamos recordar atrasos na construção das linhas elétricas que impediu a conexão de 622 MW de aerogeradores instalados na Bahia, Rio Grande do Norte e Ceará, e que desde o término das obras, em meados de 2012, ainda não estão totalmente conectados a linha de transmissão da Companhia Hidroelétrica do São Francisco (Chesf). Um desperdício, que deixa assim de injetar energia no Sistema Integrado Nacional (SIN).
Semelhante situação ocorreu em uma obra como Jirau e Santo Antônio, duas das maiores usinas do país, e que juntas, terão capacidade instalada de 6.400 MW. Neste caso os planejadores e projetistas do Ministério de Minas e Energia não levaram em conta no edital de licitação aspectos importantes da conexão da energia gerada nas hidroelétricas com as linhas de transmissão.
E finalmente, o atraso das obras da Amazonas Energia, distribuidora do grupo Eletrobrás, que impede que a linha de transmissão Tucuruí-Macapá-Manaus, com seus 1.800 km, e investimentos de R$ 3,5 bilhões, seja plenamente utilizada. Oficialmente, a conexão com o SIN ocorreu em julho de 2013 com a conclusão da linha. Mas com o atraso das obras da distribuidora, a região Norte continuará a ser abastecida pelas 27 termoelétricas que funcionam com combustíveis fósseis.
No Nordeste, a falta de linhas de transmissão e subestações em três estados impediu que a energia elétrica produzida pelo vento chegasse à casa de milhares de brasileiros. Desde junho de 2012, 26 parques eólicos estão prontos para produzir energia, mas ela não é escoada por falta de conexão até as linhas de transmissão. Calcula-se que, caso estivessem conectados, produziriam o suficiente para abastecer por mês mais do que a população de Salvador (3 milhões de pessoas).
Como entregaram os parques eólicos no prazo, os investidores recebem “religiosamente” do governo federal o que está previsto nos contratos, mesmo sem gerarem energia alguma. Em nove meses (setembro 2012/maio de 2013), foram pagos aproximadamente R$ 263 milhões aos empreendedores (em torno de 30 milhões de reais/mês). A Chesf é a responsável pelas linhas para interligar os parques eólicos a rede elétrica nacional, pois ganhou licitação para construção das mesmas em 2010, e não cumpriu os prazos. Foi multada em mais de R$ 8 milhões, e nenhum de seus diretores foi demitido.
Atualmente, ainda persiste esta situação pelo menos em dois complexos eólicos, um na Bahia e outro no Rio Grande do Norte, que estão prontos para operar desde julho do ano passado, mas não geram energia por conta que as suas ligações com o sistema de transmissão não estarem concluídas. O governo mudou recentemente as regras, e exige agora nos leilões, que os empreendedores garantam que os parques eólicos estejam conectados ao SIN ao término da obra.
Outra situação bizarra foi recentemente revelada pelo jornal Valor Econômico. Um erro inacreditável cometido na construção das usinas de Santo Antonio e Jirau, no Rio Madeira (RO), que onerou a obra em valores estimados em R$ 1,3 bilhões de reais (valor que conflita com dados oficiais que menciona em “apenas” 100 milhões de reais). Também neste caso foi cometido um “esquecimento” na conexão das usinas para o escoamento da energia através das linhas de transmissão.
Este caso de tão surrealista, merece ser relatado. Em agosto de 2008, o governo federal licitou duas das mais extensas linhas de transmissão de energia do Brasil, para ligar as usinas próximas de Porto Velho (RO) até São Carlos (município no interior de São Paulo), uma distância de 2.375 km. No momento da licitação das linhas de transmissão as duas usinas já estavam em construção.
Desde 2010 foi identificada a necessidade de instalação do GSC (Generator Station Coordinators), que permite o envio de informações necessárias ao controle mestre do sistema operacional das usinas, quanto ao número de máquinas/turbinas em operação. Este é o equipamento que faz as linhas de transmissão e as usinas se comunicarem.
Mesmo descoberto apenas no final de 2010, o problema somente foi registrado em um documento oficial em junho de 2013, durante uma das reuniões mensais do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), órgão governamental encarregado do monitoramento permanente do setor elétrico nacional. A ausência de tal sistema criou uma restrição operacional inibindo que a energia gerada possa ser transmitida na totalidade para a rede elétrica.
A falta planejamento e coordenação do governo com os demais órgãos, que cada vez mais se multiplicam no setor elétrico, também é claramente demonstrado em outra obra da região Norte. A construção do “linhão” (também chamada às linhas de transmissão) Tucuruí-Macapá-Manaus teve como objetivo interligar a maior parte da Região Norte ao sistema elétrico nacional. Obra grandiosa, e que demorou 5 anos para ser concluída (3 anos a mais do que o previsto), com suas 3.351 torres de 295 metros de altura (equivalente a um prédio com 100 andares) em plena selva Amazônica. Mesmo finalizada, somente 10% de sua capacidade esta sendo utilizada.
Obras que ficaram sob a responsabilidade da Amazonas Energia (do grupo Eletrobrás), como subestações (das cinco novas previstas, só uma foi concluída), de quatro linhas menores de transmissão projetadas, duas ainda estão em obras, impedindo assim a plena utilização do sistema. Considerando o atraso de 3 anos na construção do “linhão”, ainda assim, obras menores não chegaram ao seu término. Caso estivessem prontas como previstas, permitiriam abastecer a região com energia gerada pelas hidrelétricas. O que não aconteceu, pois ainda as 27 térmicas existentes naquele território continuarão a fornecer eletricidade a partir dos combustíveis fosseis. Até o ano passado, os recursos para cobrir o custo das térmicas na região, considerada como sistema isolado, eram cobrados na conta de luz de todos os brasileiros e depositados na Conta de Consumo de Combustíveis (CCC), que foi absorvida no começo de 2013, por outro encargo Conta de Desenvolvimento Energético (CDE).
Portanto, a prometida economia de R$ 2 bilhões, pelo fato de não mais ter que usar as usinas térmicas permanentemente, vai ficar para depois. Para aliviar uma incidência maior do custo da energia para os consumidores, o governo afirma que priorizará o funcionamento das 8 usinas a gás natural, cujo custo da energia gerada é mais barata. As 19 outras usinas térmicas movidas a combustíveis fosseis (óleo diesel e óleo combustível) são mais caras, chegando a custar R$ 1 mil o MWh.
Obviamente o prazo da construção da linha de transmissão, assim como a instalação de equipamentos, e outras obras menores necessários à conexão entre a geração e a transmissão, teriam que estar sincronizadas. Esses contratos de construção têm que estar fechado com multas, com compromisso, com responsabilidade, de tal forma que seja viável a execução da linha naquele prazo. É inadmissível que em obras estruturais desta magnitude, fatos assim ocorram.
Situações descritas acima não somente tem levado a desperdícios de recursos financeiros bancados pelo tesouro nacional (dinheiro de todos), mas também levado que usinas térmicas movidas a combustíveis fósseis, principais responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa, sejam autorizadas a funcionar no Norte e Nordeste, aumentando substancialmente as emissões de gases.
O limite da incompetência das autoridades responsáveis pelo setor elétrico há muito passou da conta.
Heitor Scalambrini Costa, Articulista do Portal EcoDebate, é Professor da Universidade Federal de Pernambuco.
Fonte: EcoDebate
Não caberia neste singelo artigo de opinião, relatar as inúmeras “atrapalhadas” comandadas pelos sábios e “experts” de um setor, que se caracteriza pela falta de transparência.
Para citar apenas três situações esdrúxulas causadas pelos erros e/ou incompetência, vamos recordar atrasos na construção das linhas elétricas que impediu a conexão de 622 MW de aerogeradores instalados na Bahia, Rio Grande do Norte e Ceará, e que desde o término das obras, em meados de 2012, ainda não estão totalmente conectados a linha de transmissão da Companhia Hidroelétrica do São Francisco (Chesf). Um desperdício, que deixa assim de injetar energia no Sistema Integrado Nacional (SIN).
Semelhante situação ocorreu em uma obra como Jirau e Santo Antônio, duas das maiores usinas do país, e que juntas, terão capacidade instalada de 6.400 MW. Neste caso os planejadores e projetistas do Ministério de Minas e Energia não levaram em conta no edital de licitação aspectos importantes da conexão da energia gerada nas hidroelétricas com as linhas de transmissão.
E finalmente, o atraso das obras da Amazonas Energia, distribuidora do grupo Eletrobrás, que impede que a linha de transmissão Tucuruí-Macapá-Manaus, com seus 1.800 km, e investimentos de R$ 3,5 bilhões, seja plenamente utilizada. Oficialmente, a conexão com o SIN ocorreu em julho de 2013 com a conclusão da linha. Mas com o atraso das obras da distribuidora, a região Norte continuará a ser abastecida pelas 27 termoelétricas que funcionam com combustíveis fósseis.
No Nordeste, a falta de linhas de transmissão e subestações em três estados impediu que a energia elétrica produzida pelo vento chegasse à casa de milhares de brasileiros. Desde junho de 2012, 26 parques eólicos estão prontos para produzir energia, mas ela não é escoada por falta de conexão até as linhas de transmissão. Calcula-se que, caso estivessem conectados, produziriam o suficiente para abastecer por mês mais do que a população de Salvador (3 milhões de pessoas).
Como entregaram os parques eólicos no prazo, os investidores recebem “religiosamente” do governo federal o que está previsto nos contratos, mesmo sem gerarem energia alguma. Em nove meses (setembro 2012/maio de 2013), foram pagos aproximadamente R$ 263 milhões aos empreendedores (em torno de 30 milhões de reais/mês). A Chesf é a responsável pelas linhas para interligar os parques eólicos a rede elétrica nacional, pois ganhou licitação para construção das mesmas em 2010, e não cumpriu os prazos. Foi multada em mais de R$ 8 milhões, e nenhum de seus diretores foi demitido.
Atualmente, ainda persiste esta situação pelo menos em dois complexos eólicos, um na Bahia e outro no Rio Grande do Norte, que estão prontos para operar desde julho do ano passado, mas não geram energia por conta que as suas ligações com o sistema de transmissão não estarem concluídas. O governo mudou recentemente as regras, e exige agora nos leilões, que os empreendedores garantam que os parques eólicos estejam conectados ao SIN ao término da obra.
Outra situação bizarra foi recentemente revelada pelo jornal Valor Econômico. Um erro inacreditável cometido na construção das usinas de Santo Antonio e Jirau, no Rio Madeira (RO), que onerou a obra em valores estimados em R$ 1,3 bilhões de reais (valor que conflita com dados oficiais que menciona em “apenas” 100 milhões de reais). Também neste caso foi cometido um “esquecimento” na conexão das usinas para o escoamento da energia através das linhas de transmissão.
Este caso de tão surrealista, merece ser relatado. Em agosto de 2008, o governo federal licitou duas das mais extensas linhas de transmissão de energia do Brasil, para ligar as usinas próximas de Porto Velho (RO) até São Carlos (município no interior de São Paulo), uma distância de 2.375 km. No momento da licitação das linhas de transmissão as duas usinas já estavam em construção.
Desde 2010 foi identificada a necessidade de instalação do GSC (Generator Station Coordinators), que permite o envio de informações necessárias ao controle mestre do sistema operacional das usinas, quanto ao número de máquinas/turbinas em operação. Este é o equipamento que faz as linhas de transmissão e as usinas se comunicarem.
Mesmo descoberto apenas no final de 2010, o problema somente foi registrado em um documento oficial em junho de 2013, durante uma das reuniões mensais do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), órgão governamental encarregado do monitoramento permanente do setor elétrico nacional. A ausência de tal sistema criou uma restrição operacional inibindo que a energia gerada possa ser transmitida na totalidade para a rede elétrica.
A falta planejamento e coordenação do governo com os demais órgãos, que cada vez mais se multiplicam no setor elétrico, também é claramente demonstrado em outra obra da região Norte. A construção do “linhão” (também chamada às linhas de transmissão) Tucuruí-Macapá-Manaus teve como objetivo interligar a maior parte da Região Norte ao sistema elétrico nacional. Obra grandiosa, e que demorou 5 anos para ser concluída (3 anos a mais do que o previsto), com suas 3.351 torres de 295 metros de altura (equivalente a um prédio com 100 andares) em plena selva Amazônica. Mesmo finalizada, somente 10% de sua capacidade esta sendo utilizada.
Obras que ficaram sob a responsabilidade da Amazonas Energia (do grupo Eletrobrás), como subestações (das cinco novas previstas, só uma foi concluída), de quatro linhas menores de transmissão projetadas, duas ainda estão em obras, impedindo assim a plena utilização do sistema. Considerando o atraso de 3 anos na construção do “linhão”, ainda assim, obras menores não chegaram ao seu término. Caso estivessem prontas como previstas, permitiriam abastecer a região com energia gerada pelas hidrelétricas. O que não aconteceu, pois ainda as 27 térmicas existentes naquele território continuarão a fornecer eletricidade a partir dos combustíveis fosseis. Até o ano passado, os recursos para cobrir o custo das térmicas na região, considerada como sistema isolado, eram cobrados na conta de luz de todos os brasileiros e depositados na Conta de Consumo de Combustíveis (CCC), que foi absorvida no começo de 2013, por outro encargo Conta de Desenvolvimento Energético (CDE).
Portanto, a prometida economia de R$ 2 bilhões, pelo fato de não mais ter que usar as usinas térmicas permanentemente, vai ficar para depois. Para aliviar uma incidência maior do custo da energia para os consumidores, o governo afirma que priorizará o funcionamento das 8 usinas a gás natural, cujo custo da energia gerada é mais barata. As 19 outras usinas térmicas movidas a combustíveis fosseis (óleo diesel e óleo combustível) são mais caras, chegando a custar R$ 1 mil o MWh.
Obviamente o prazo da construção da linha de transmissão, assim como a instalação de equipamentos, e outras obras menores necessários à conexão entre a geração e a transmissão, teriam que estar sincronizadas. Esses contratos de construção têm que estar fechado com multas, com compromisso, com responsabilidade, de tal forma que seja viável a execução da linha naquele prazo. É inadmissível que em obras estruturais desta magnitude, fatos assim ocorram.
Situações descritas acima não somente tem levado a desperdícios de recursos financeiros bancados pelo tesouro nacional (dinheiro de todos), mas também levado que usinas térmicas movidas a combustíveis fósseis, principais responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa, sejam autorizadas a funcionar no Norte e Nordeste, aumentando substancialmente as emissões de gases.
O limite da incompetência das autoridades responsáveis pelo setor elétrico há muito passou da conta.
Heitor Scalambrini Costa, Articulista do Portal EcoDebate, é Professor da Universidade Federal de Pernambuco.
Fonte: EcoDebate
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