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sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Migração, fecundidade e o decrescimento da população de Portugal, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

As taxas de fecundidade das mulheres portuguesas já estavam abaixo do nível de reposição desde o início dos anos de 1980. Porém, as projeções indicavam que a população de Portugal ainda cresceria (devido à inércia demográfica) durante mais alguns anos em função dos saldos migratórios positivos. Esperava-se, também, uma certa recuperação das taxas de fecundidade.
Todavia, a crise econômica que começou em 2008 e ainda não deu sinal de superação acelerou o processo de declínio populacional. O crescimento vegetativo (mortalidade menos natalidade) já tinha sinal negativo desde 2008. Mas o saldo migratório era positivo, dando reforço à tese da migração de reposição, ou seja, quando há decrescimento do saldo demográfico natural espera-se que a migração mantenha a população estável ou com pequeno crescimento.

Mas os últimos dados demográficos de Portugal estão mostrando que tanto o saldo vegetativo quanto o saldo migratório foram negativos em 2010 e 2011. Reportagem de Patricia Mello da Folha, de 11 de agosto de 2013, mostra que Portugal pode perder 1 milhão de habitantes (10% da população) em 10 a 20 anos. Cerca de 100 mil portugueses emigram por ano desde 2010, o número de óbitos está 6 mil acima do número de nascimentos e a taxa de fecundidade está em 1,3 filho por mulher. Sem perspectiva econômica, dificilmente a situação demográfica vai melhorar, sendo que a crise demográfica agrava a crise econômica. Portugal está em um “ciclo vicioso” e em uma espiral de decrescimento.

A teoria demográfica supõe que o nascimento de um menor número de filhos levaria a uma menor oferta de mão de obra o que diminuiria o desemprego e aumentaria os salários. O demógrafo Richard Easterlin encontrou, para os Estados Unidos da América (EUA), esta relação cíclica entre a dinâmica demográfica, as oportunidades de emprego e salários e o número de filhos (fecundidade). Segundo ele “Cortes menores tendem a ter melhores oportunidades no mercado de trabalho e com isto se casariam mais cedo e teriam mais filhos”.

De fato, nos EUA as taxas de fecundidade caíram durante a grande depressão da década de 1930, subiram depois do fim da Segunda Guerra Mundial, caíram novamente entre 1965 e 1985 e subiram novamente entre 1985 e 2007. Com a crise econômica de 2008 e 2009 a fecundidade das mulheres americanas já apresentou um ligeiro declínio sendo que a TFT estava em 1,9 filhos por mulher em 2011.

Esta tendência cíclica não foi observada em outros países. Na Europa, os países mediterrâneos, Itália, Grécia e Espanha apresentaram taxas de fecundidade em declínio desde 1950, sem grandes variações cíclicas, e que atingiram o nível mais baixo na virada do milênio. Estes três países tinham taxas de fecundidade total (TFT) entre 2,5 e 3,0 filhos por mulher em meados do século passado e chegaram a 1,2 e 1,3 filhos por mulher entre 1995 e 2005. Estas taxas super-baixas (lowest low fertility) decorrem em parte do “efeito tempo” positivo, isto é, as mulheres adiaram o nascimento do primeiro filho, jogando a TFT para baixo.

No quinquênio 2005-2010, os três países apresentaram aumento das taxas de fecundidade que subiram para algo em torno de 1,4 filho por mulher. O aumento foi pequeno, mas refletiu uma reversão na tendência de queda e apontava para uma recuperação da fecundidade rumo ao nível de reposição. Vários programas de cunho pró-natalistas foram adotados, mas depois abandonados ou deixados em segundo plano com a crise econômica.

Isto acontece porque o baixo crescimento econômico, as baixas taxas de investimento e o maior poder de barganha das parcelas idosas da população (inclusive com o envelhecimento do eleitorado) tendem a canalizar recursos para o topo da pirâmide e as jovens gerações deixariam de contar com recursos para se comportar de acordo com o Easterlin Effect. Ao invés da mobilidade das gerações, o que tem surgido é o choque de gerações, com as pessoas da base perdendo para o topo da pirâmide populacional, gerando um “efeito Easterlin” ao reverso.

Portugal também está mostrando a mesma tendência. O declínio econômico está provocando o declínio da fecundidade (que já estava baixa) e transformando a imigração em emigração. Há muitos portugueses jovens indo trabalhar na Alemanha ou migrando para o Brasil, Angola ou Moçambique (ex-colônias portuguesas).

O caso de Portugal pode ser ilustrativo para o Brasil, pois as taxas de fecundidade brasileiras estão abaixo do nível de reposição e a população deve começar a diminuir na década de 2030. O Brasil pode voltar a ser um país de imigração. Mas se houver crise econômica, em vez de atrair força de trabalho e cérebros, o país pode se tornar exportador (involuntário) de suas riquezas humanas, como acontece atualmente com Portugal.

 Referência e gráficos:

HUGH, Edward. Portugal tem “falta de Japoneses”. Lisboa. 08/05/2013

http://mais1economistadebancada.blogspot.com.br/

http://fistfulofeuros.net/afoe/the-great-portuguese-hollowing-out/

MELLO, Patrícia Campos. Portugal vive sua maior crise demográfica. Folha de São Paulo, 11/08/2013

http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2013/08/1324806-portugal-vive-sua-maior-crise-demografica.shtml

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

Fonte: EcoDebate

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