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terça-feira, 6 de agosto de 2013

Governo diz que ainda procura parceria com Cuba para trazer médicos

Segundo o Ministério da Saúde, o governo não desistiu da importação dos profissionais cubanos. Mas não há prazo para a definição da parceria
A vinda de 6 mil médicos cubanos para suprir a falta de profissionais em áreas carentes do Brasil, anunciada pelo ministro Antonio Patriota (Relações Exteriores) em maio deste ano, foi suspensa temporariamente pelo governo brasileiro, que decidiu priorizar as inscrições individuais de médicos estrangeiros com o lançamento do programa Mais Médicos. Segundo o Ministério da Saúde, a pasta não tem "nenhum preconceito" com a medicina cubana, e um termo de cooperação ainda deve ser assinado entre os dois países.

"O ministério está trabalhando com o modelo de chamamento individual e, encerrado esse processo, o ministério está aberto a discutir com outros países, incluindo Cuba, a possibilidade de fazer outras formas de cooperação, seja com governos ou universidades", informou o ministério por meio de sua assessoria. No entanto, a pasta disse que não existe definição de quando isso será feito, já que a prioridade é colocar em prática o modelo de inscrições individuais pelo Mais Médicos.

A primeira adesão ao programa teve o período de inscrições encerrado no fim de julho. De acordo com balanço do Ministério da Saúde, 1.753 profissionais homologaram a inscrição até quinta-feira (o prazo vai até o dia 5), número muito inferior ao número de vagas disponíveis: cerca de 15 mil. Uma nova etapa será aberta no dia 15 deste mês. A partir daí, quando o programa tomar forma, o governo vai saber as carências e definir outras formas de cooperação.

As negociações com Cuba para a vinda de 6 mil médicos foram paralisadas no começo de julho, com o lançamento do Mais Médicos, que entre outras medidas prevê a "importação" de profissionais estrangeiros para preencher vagas não ocupadas por brasileiros nas regiões carentes. Como o programa determina a inscrição de forma individual, Cuba ficou de fora - o país caribenho faz convênios coletivos com governos.

A participação da ilha é estratégica para o Brasil, já que atende aos requisitos principais do programa: número de médicos superior ao recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e idioma semelhante ao português. 

Além disso, a medicina cubana prioriza o atendimento básico, um dos pilares da proposta do governo.

Segundo informações divulgadas pela rede BBC em junho deste ano, 15 mil médicos cubanos atuam em 60 países, gerando lucros milionários ao regime - as cifras mais otimistas falam em até US$ 5 bilhões ao ano. Uma das maiores parcerias em andamento é com a Venezuela. No convênio firmado entre os dois países, Cuba funciona como uma empresa que presta o serviço médico. O profissional recebe apenas uma parte do valor, que é repassado diretamente pelo governo venezuelano a Havana.

Vamos para onde ninguém que ir, diz médico formado em Cuba

O brasileiro Marcus Dutra faz parte do contingente de médicos formados em Cuba que trabalha na Venezuela. Em 2014 ele deixou a cidade de Bom Jesus, no interior gaúcho, para estudar na Escola Lationamericana de Medicina (Elam). Seis anos depois, já formado, ele se integrou ao Batalhão 51, um exército - como ele mesmo define - de jovens que trabalha nos lugares de mais difícil acesso, comunidades indígenas e fronteiras.

Por meio da parceria entre Cuba e a Venezuela, o brasileiro passou a viver em uma comunidade indígena isolada - são necessárias quatro horas de barco para chegar ao local. "Logicamente que essa experiência e essa disposição de ir onde outros médicos se recusam a ir foi inculcada em mim pela formação médica que tive em Cuba, lugar onde a atenção médica é realmente impressionante", diz ao citar como exemplos o controle de doenças, a baixa mortalidade infantil - morrem menos crianças no nascimento ou no primeiro ano de vida que nos Estados Unidos - e a preocupação com o paciente.

 "É do exemplo que se aprende, e os cubanos nos ensinaram que o que realmente importa é estar onde mais te necessitam, e não onde se vive melhor. Acredito que além dos serviços de alta qualidade, reconhecidos por todas as organizações de saúde do planeta, os cubanos podem deixar esse exemplo, da medicina humana, solidária. E isso é justamente o que assusta a elite brasileira, que é racista desde sempre", afirmou o brasileiro, ao fazer referência às críticas ao programa Mais Médicos.

Vivendo no Brasil há 15 anos, o médico cubano Juan Carlos Raxach também diz que o que prejudica a vinda de profissionais da ilha é o preconceito de alguns grupos. Raxach, que trabalha para a Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia), no Rio de Janeiro, chegou a escrever uma carta de desabafo após ouvir de representantes de entidades médicas que "Cuba só tem charutos para exportar". "O que existe é preconceito. O profissional formado em Cuba já demonstrou êxito em programas de saúde não só na Venezuela, como na África e até em Portugal. (...) Esse olhar da prevenção, eu acho que vai ajudar muito no Brasil", afirmou em entrevista ao Terra.

No entanto,Juan Carlos afirma que a contratação de médicos precisa vir acompanhada de investimentos na melhoria do sistema de saúde. "Não é só falta de profissionais. É só ver a situação do Rio de Janeiro, os hospitais estão sucateados, não tem leitos, falta articulação entre municípios, Estados e o governo federal", criticou Juan Carlos, que trabalha com a gestão de projetos na Abia e não exerce a medicina no Brasil.

CFM fala em 'importação de ideologia'

Contrário à vinda de médicos estrangeiros sem passar pela revalidação dos diplomas, o Conselho Federal de Medicina (CFM) faz duras críticas à proposta de trazer médicos cubanos. "São médicos ideológicos, que vêm para propagar o sistema cubano. Muitos brasileiros ligados ao MST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra) e ao PT foram fazer medicina em Cuba, agora querem legitimar esse modelo", critica o diretor do CFM, Desiré Callegari.

O conselho pediu investigação da Polícia Federal e do Ministério Público sobre o modelo de inscrições no Mais Médicos. Segundo a entidade, o sistema prejudicou a inscrição de médicos brasileiros - o CFM alega que muitos não conseguiram anexar documentos e que o programa não reconheceu registros profissionais expedidos recentemente. Para Desiré Callegari, essas dificuldades podem ter a intenção de garantir a vinda de profissionais do exterior.

Ele argumenta que não é contra os médicos cubanos, mas diz que para virem trabalhar no Brasil precisam revalidar os diplomas. "Se não houver revalidação do diploma no Brasil somos contra, porque estaremos dando para a população uma medicina de segunda linha", disse. Callegari argumenta que é temeroso liberar a entrada desses profissionais, já que na última edição do exame de revalidação dos diplomas médicos apenas 20 dos 182 profissionais formados em Cuba inscritos conseguiram a aprovação. "Não passam porque o curso de medicina em Cuba deixa muito a desejar", argumenta.

Fonte: Jornal da Ciência

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