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quinta-feira, 8 de agosto de 2013

‘Teses’ sobre junho de 2013, artigo de Montserrat Martins

Na época em que eclodia a primavera árabe, por acaso estava em Porto Alegre o Fernando Gabeira e ele apresentou numa palestra a tese da falta de alimentos na região como o fator subjacente àquele movimento, descrente do poder de influência das redes sociais no comportamento das multidões. Seria necessário um fator concreto, como a fome, para manifestações daquela magnitude.

Mais casualmente ainda, um pouco antes das manifestações de junho no Brasil, o mesmo Gabeira esteve novamente em Porto Alegre e na sua fala no Fronteiras do Pensamento manteve a mesma linha de raciocínio, de que só motivos concretos levariam a mudanças. Se mostrou descrente em mobilizações sociais no país, vendo aqui um povo acomodado, o que relacionou com a falta de investimentos em educação. Cito Gabeira ao acaso, pela coincidência de suas falas em momentos históricos recentes, mas sua linha de raciocínio era absolutamente majoritária entre os intelectuais brasileiros: tudo estava acomodado e redes sociais não vão às ruas.

A estabilidade econômica no país, com níveis de trabalho próximos do pleno emprego e melhores que os índices europeus, jamais poderia dar motivos para mobilizações sociais contestadoras. Para falar a verdade não foram só os intelectuais brasileiros que ficaram surpresos, os analistas internacionais também. Acostumados com movimentos em países em crise, como a Grécia ou a Espanha – cujos índices de desemprego ultrapassavam 25%, explicando facilmente suas turbulências sociais – os comentaristas internacionais também não sabiam como entender os movimentos de rua brasileiros.

Uma linha de raciocínio que surgiu rapidamente entre os governistas foi a de que os movimentos eram insuflados pela ‘direita’ para desestabilizar a coalizão de governo. Mas então como explicar os ataques aos grandes veículos da mídia e o susto dessa mesma grande mídia com aqueles movimentos? Caetano Veloso disse uma vez que no Brasil “os jornalistas são petistas e os donos dos jornais são tucanos”, mas nenhum desses grupos estava à frente desses movimentos, que aliás se proclamavam como não tendo líderes. A tese conspiratória incitava o medo a articulações em curso entre militares, mas o mais próximo disso que se viu foram ensaios de protestos de policiais militares por melhores salários.

A tese de que turbulências sociais são mera decorrência das econômicas não serviu pra explicar junho. A tese conspiratória também não. Na falta de novas candidatas a teses consensuais, ou pelo menos de “teses hegemônicas”, junho de 2013 permanece sem explicações e sem donos. Resta a hipótese de que não haja teses a fazer, sobre mensagens que foram claras em si mesmas: chega de aumentos de tarifas, queremos melhorias no transporte público, mais investimentos no SUS e menos no futebol, mais em educação, basta de corrupção – mensagens explícitas, que não requerem interpretações.

Por fim, fica uma indagação quanto à falta de protestos pelos problemas ambientais. Em 2013 o desmatamento cresceu cerca de 400%, depois da “flexibilização” do Código Florestal, que era rejeitada por 70% das pessoas em pesquisas de opinião. Mas o desmatamento contra a vontade popular não estava incluído nos protestos, o que talvez explique o pessimismo do Gabeira – um dos primeiros a levantar politicamente a bandeira ambiental – com as mudanças sociais.

Montserrat Martins, Colunista do Portal EcoDebate, é Psiquiatra.

Fonte: EcoDebate

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