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sexta-feira, 7 de junho de 2013

Sem chão





      Montserrat Martins

      Décadas a fio tirando areia do Jacuí irregularmente e agora as mineradoras não sabem onde buscar areia para a construção civil. A extração feita próxima da costa tira a sustentação do solo e tudo que está sobre a margem sucumbe, o chamado “solapamento”, minando os alicerces do que estiver sobre o solo. Para não abalar mais o solo, a decisão judicial acabou abalando os negócios: o metro cúbico de areia era comercializado até então por 50 reais, mas desde que foi suspensa a extração no rio Jacuí o preço dobrou e o ramo da construção no RS se declarou praticamente paralisado.



      Com a omissão do Estado, não foram construídas alternativas viáveis. Agora se fala em abertura do Guaíba e da Lagoa dos Patos, mas os estudos sobre impactos ambientais para serem científicos (e não comprados) requerem tempo. O Guaíba, que está sendo citado, recebeu uma extensa área de aterro há meio século – qual o impacto nessa região, caso seja mesmo um novo alvo das mineradoras? No momento estão ativas as extrações nas microrregiões de Cacequi, Santa Maria, Cachoeira do Sul e Rio Pardo. Em Rio Pardo, agora, há filas de caminhões em busca de carregamentos de areia. Até chegarmos a essa situação dramática – para o ambiente, para a sociedade e para a economia – a negligência coletiva havia se tornado um hábito. Nas duas últimas décadas a mineração causou o desaparecimento de cerca de 100 praias do rio Jacuí, atingindo suas margens e as populações ribeirinhas.

      Podemos encontrar na internet, ainda, matérias de divulgação das mineradoras afirmando terem recursos científicos e tecnológicos para minimizar danos. No Seminário A Extração de Areia, promovido pelo Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Baixo Jacuí, que foi divulgado em site da empresa Somar (Sociedade Mineiradora), esta diz que há rastreamento por GPS feito em todas as dragas de mineradoras que atuam no rio, no que “a Somar foi pioneira... com ele, as atividades de mineração de areia são monitoradas 24 horas por dia pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), permitindo que técnicos do órgão verifiquem se a extração está sendo feita nos lugares e horários determinados pelas licenças ambientais. Remotamente, os fiscais também têm autonomia para suspender as atividades em caso de irregularidades” – o que só aconteceu agora, no entanto, por decisão judicial.

      As conclusões de uma Comissão da Assembléia Legislativa (criada após as denúncias na imprensa sobre “a dragagem que mata o rio Jacuí”) foram bem diferentes. Além da fragilidade do sistema de monitoramento por GPS e das já conhecidas deficiências do Estado na fiscalização, o relatório da Assembléia apontou também a extração clandestina ao lado da irregular. Mais grave ainda, identificou também a existência de práticas de extração criminosas, com formação de quadrilha, em que contam “até mesmo com guarnição armada no leito do rio, visando a proteger os infratores... acabam inibindo a ação de fiscais”.

      É uma verdadeira “caixa preta” a história da extração de areia e a fragilidade dos nossos órgãos ambientais em emitir licenças de operação minimamente embasadas em critérios científicos. Os danos ao ambiente – que deixaram muitos ribeirinhos sem chão – agora chegam à economia também. Estamos pagando por décadas de falta de seriedade e de planejamento e não há soluções emergenciais fáceis. Essa “caixa preta” merece ser aberta para aprendermos suas lições.

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