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quinta-feira, 6 de junho de 2013
Joaçaba - uma decisão judicial inédita
Ana Echevenguá
A proteção ambiental objetiva a preservação da natureza em todos os elementos necessários à vida e à manutenção do equilíbrio ecológico e social, diante do instinto predatório das atitudes civilizadas que, em nome do desenvolvimento e socialização da humanidade, devastam florestas, distratam o solo, extinguem a fauna, poluem as águas e o ar1. Fernando Cordioli Garcia, Juiz Substituto.
A proteção ambiental objetiva a preservação da natureza em todos os elementos necessários à vida e à manutenção do equilíbrio ecológico e social, diante do instinto predatório das atitudes civilizadas que, em nome do desenvolvimento e socialização da humanidade, devastam florestas, distratam o solo, extinguem a fauna, poluem as águas e o ar1. Fernando Cordioli Garcia, Juiz Substituto.
Construções irregulares em APP - Área de Preservação Permanente -, sem qualquer autorização, permissão, ou consulta aos órgãos ambientais competentes, são corriqueiras em Santa Catarina. Muitas vezes, privilégio dos amigos do rei.
Um vereador de Joaçaba construiu sua casa há 6 metros da margem de um córrego (uma APP); para tanto, promoveu destruição de floresta de preservação permanente, sem qualquer autorização de órgão competente.
O caso foi parar já Justiça. O juiz entendeu que o caso era um total desrespeito à lei e à sociedade, e “que qualquer dano causado ao meio ambiente, afronta à coletividade e ao interesse público”. Na sentença, bem fundamentada, fixou o prazo de 72 horas para que a FATMA, com o auxílio da Polícia Militar Ambiental, realizasse a demolição.
O que a FATMA2 fez? Agindo na defesa do vereador, requereu prazo maior para cumprir a decisão.
Pediu mas não levou. Vejam o canetaço do juiz: se a FATMA não pode, a demolição será “operacionalizada e fiscalizada, pessoalmente, por este Juiz, com o acompanhamento do Oficial de Justiça, com urgência”. E mandou cópia do processo para a Curadoria do Meio Ambiente, diante das suspeitas de “crime de desobediência, ou qualquer outra improbidade, diante da incapacidade técnica da FATMA de se desincumbir de seu mister”.
Ato contínuo - com o perdão da palavra -, o magistrado tirou a bunda da cadeira e, na última quarta-feira, acompanhou a demolição do imóvel de propriedade de Elói Hoffelder, localizado na Linha Antinha, interior do município de Joaçaba.
A história não termina aí. O réu vai pagar uma indenização de R$40.000,00 ao FRBL - Fundo para a Reconstituição dos Bens Lesados, vai cercar a área de sua propriedade e plantar mudas de árvores nativas para recompor o ambiente natural do local, sob pena de multa de R$ 100,00 para o atraso do cumprimento dessa obrigação3.
Palmas presse juiz que ele merece! Como a mídia convencional não divulga esse tipo de atitude, vamos bater o bumbo para essa boa nova!
Tomara que isso serva de exemplo aos demais integrantes do Poder Judiciário, que adquiriram um apreço doentio pelo formalismo e esqueceram da sua obrigação institucional e constitucional de defender o meio ambiente para a presente e futura geração!
1 - Autos n° 037.09.004930-2, Ação Civil Pública, Joaçaba / 2ª Vara Cível. Autor: Ministério Público do Estado de Santa Catarina; Réu: ELoi Hoffelder.
2 - FATMA é o órgão ambiental da esfera estadual do Governo de Santa Catarina.
3 - http://joacaba.tj.sc.gov.br/cpopg/pcpoResultadoPG.jsp?CDP=110001KMJ0000&nuProcesso=37090049302&nuRecurso=0&cbPesquisa=NMPARTE&cdForo=37#
Ana Echevenguá, advogada ambientalista, coordenadora do programa Eco&Ação, presidente do Instituto Eco&Ação e da Academia Livre das Água, e-mail: ana@ecoeacao.com.br, website: www.ecoeacao.com.br.
Íntegra da sentença:
Autos n ° 037.09.004930-2
Ação: Ação Civil Pública/Lei Especial
Autor: Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Réu: ELoi Hoffelder
SENTENÇA
Vistos, etc.
O MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA, por seu Promotor de Justiça, ingressou com a presente Ação Civil Pública, em desfavor de ELÓI HOFFELDER, alegando, em suma, a construção irregular de obra pelo réu em Área de Preservação Permanente – APP, sem qualquer autorização, permissão, ou consulta aos órgãos ambientais competentes.
Alega que o demandado edificou na Linha Antinha, interior do Município de Joaçaba, construção mista com dois andares de aproximadamente 40 m² de área total a menos de 10 (dez) metros de curso d'água, promovendo destruição de floresta considerada de preservação permanente, sem qualquer autorização de órgão competente.
Dito isto, requereu: a) a citação do réu; b) a procedência do pedido; c) a obrigação do requerido, caso decida-se pela permanência da obra no local investigado, ao tratamento dos efluentes e melhoria da mata ciliar; d) a condenação do requerido ao pagamento de custas e honorários advocatícios. Valorou a causa e acostou documentos.
Citado, contestou o requerido (fls. 51/54), alegando que na época do início da construção descrita à exordial, o plano diretor não exigia projeto e autorização de órgão ambiental competente, pois se tratava de área rural.
Ao final, requereu que seja a obra conservada. Ademais, pugna pela produção de provas.
Réplica vazada às fls. 56/59.
Vieram-me os autos conclusos.
É o relato.
FUNDAMENTO.
O feito comporta julgamento no estado em que se encontra, dispensando a produção de outras provas (art. 330, inciso I, do CPC). Sobre o tema, tem enfatizado o Tribunal de Santa Catarina:
A necessidade da produção de outras, além das já existentes nos autos, se submete à prudente discrição do juiz, impondo-se o julgamento antecipado da lide quando as provas requeridas pelas partes forem absolutamente irrelevantes para o pronunciamento do juízo decisório. (Apelação Cível nº39.999, de Itajaí, rel. Des. Wilson Guarany).
O meio ambiente foi reconhecido como bem jurídico autônomo pelo art. 3º, I, da Lei n.º 6.938/1981, que o definiu como "o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas".
Posteriormente, com o advento do art. 225, caput, da Constituição Federal de 1988, a autonomia jurídica do bem ambiental resultou definitivamente consolidada com a sua qualificação como "bem de uso comum do povo", fato que, por si só, reflete o primordial interesse público na conservação do meio ambiente e na sadia qualidade de vida.
O surgimento do direito ao meio ambiente e dos demais direitos fundamentais de terceira geração é assim explicado pela doutrina:
Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos da terceira geração tendem a cristalizar-se neste fim de século enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um determinado Estado. Têm primeiro por destinatário o gênero humano, mesmo num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade correta. Os publicistas e os juristas já os enumeram com familiaridade, assinalando-lhe o caráter fascinante do coroamento de uma evolução de trezentos anos dos direitos fundamentais. Emergiram eles da reflexão sobre temas referentes ao desenvolvimento à paz, ao meio ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidadeh (Paulo Bonavides. Curso de Direito Constitucional. 19 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 569).
O artigo 225 da Constituição Federal também dispõe que incumbe "ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.". Nesse sentido o preceptivo constitucional inserto no art. 23, caput, VI, que estabelece a solidariedade de todos os entes do Poder Público para a proteção do meio ambiente e o combate a todas as formas de poluição.
A proteção ambiental objetiva a preservação da natureza em todos os elementos necessários à vida e à manutenção do equilíbrio ecológico e social, diante do instinto predatório das atitudes civilizadas que, em nome do desenvolvimento e socialização da humanidade, devastam florestas, distratam o solo, extinguem a fauna, poluem as águas e o ar.
Prima facie, vale citar o que encontra-se estatuído no art. 24, IV da carta Magna Nacional:
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição.
Sobre a legislação do referido artigo, leciona Celso Ribeiro Bastos:
A união fica adstrita à edição de normas gerais, embora nem sempre seja claro em que se distinguem as normas gerais das não gerais. Essa legislação da União não exclui o poder dos Estados e do Distrito Federal, suplementarmente, de disporem sobre a mesma matéria. Deve-se entender por suplementarmente o seguinte: na inexistência de lei federal os Estados e o Distrito Federal legislarão livremente, sem restrições. A sobrevinda, contudo, ou a preexistência de uma lei federal sobre a matéria só tornam válidas as disposições que não contrariem as normas gerais da União (Curso de direito constitucional. 22. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 306).
Servindo como instrumento para que fosse proporcionada segurança ao meio ambiente, foram criados o Código Florestal (Lei 4771/65) e a Lei de Política do Meio Ambiente (nº 6.983/81). Para tanto, estipula o Código Florestal em seu art. 1.º :
Art. 1° As florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de propriedade, com as limitações que a legislação em geral e especialmente esta Lei estabelecem. § 2o Para os efeitos deste Código, entende-se por: II - área de preservação permanente: área protegida nos termos dos arts. 2o e 3o desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.
O artigo 2º do Código Florestal disserta sobre as Áreas de Preservação Permanente, bem como as metragens que construções devem respeitar ao longo dos mananciais, outrossim, mais do que notório que deverá ser esta a legislação adotada para que se resolva a lide. Cabe esclarecer ainda, que a definição para área de preservação permanente, referem-se às áreas situadas ao lado de rios, córregos ou mesmo banhados.
Passando à análise dos autos, verifica-se que a inicial está fundamentada em um Auto de Constatação nº 00258/2008, elaborado pela Polícia Militar Ambiental (fls. 11/14), que acusa como estando irregular a obra de propriedade do réu, posto não possuir autorização tampouco projeto para a edificação.
Reforçando, tem-se o disposto na lei 4.771 de 15 de setembro de 1965, que discorre da seguinte forma:
Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas: a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será: 1 - de 30 (trinta) metros para os cursos d'água de menos de 10 (dez) metros de largura; 2 - de 50 (cinquenta) metros para os cursos d'água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura; 3 - de 100 (cem) metros para os cursos d'água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura; 4 - de 200 (duzentos) metros para os cursos d'água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura; 5 - de 500 (quinhentos) metros para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros.
Se dispõe a alegar o réu que não efetuou nenhum projeto e não pediu autorização à órgão competente, somente pelo fato de não constar no plano diretor da época do início das obras, nenhuma especificação ou empecilho contra a execução da obra no local. Afirma que a construção não agrediu em nada a área e que pretende arborizar ainda mmais o local.
No entanto, improcedentes as alegações do réu, posto que se baseia no que se encontrava em regulamento antigo, seja o plano diretor vigente à época do início das obras, fere visivelmente a hierarquia das leis.
Cabe salientar também, que o Código Florestal é claro ao proibir construção ao leito das áreas de proteção com aplicação, neste caso, art. 2º, "a", 1, que considera como área de preservação distância 'de 30 (trinta) metros para os cursos d'água de menos de 10 (dez) metros de largura" e como se extrai do laudo sobre a ocupação do imóvel às fls. 31/40, o autor edificou sua casa mista à apenas 6 (seis) metros e cinquenta centímetros da margem do córrego, o que por si só, independente de qualquer lei, denota a intenção poluidora do réu, que é vereador.
Em se tratanto das alegações do réu sobre o exposto do plano diretor da época, o Código Florestal faz menção ao plano diretor, em que, onde se tratando de áreas urbanas, podendo ser utilizado o que neste estiver prescrito, mas sempre em observância com o disposto no artigo 2.° do Código Florestal supra mencionado. Ou seja, independente do antigo plano diretor falar ou não sobre a possibilidade da obra na área de proteção, este jamais poderia dispor sobre a possibilidade de construção em área de proteção, inferior aos 30 metros já especificados.
Somente a título de esclarecimento, mesmo o réu tendo projeto para construção e suposto alvará, este seria indevido, posto ser APP. Acerca da impossibilidade da concessão de alvará para a construção em APPs, colhe-se da jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
ADMINISTRATIVO. AUTUAÇÃO EM OBRAS DA CONSTRUÇÃO CIVIL. LICENÇA MUNICIPAL. CÓDIGO FLORESTAL. IBAMA. 1. A fixação de norma relativa à proteção ambiental é matéria de interesse geral e, portanto, de competência legislativa federal. Licença Municipal, como no caso para a construção de condomínio residencial próximo a curso d'água com largura superior a 50 m, não pode extrapolar norma Federal de caráter geral. 2. A alegação de possível ilegalidade existente em outras construções no mesmo local não é capaz de justificar a ilegalidade que originou a atuação do órgão fiscalizador. 3. Presume-se legítima a avaliação da autoridade administrativa em ato praticado em caráter de urgência, como no caso dos autos, cujo embargo administrativo se deu em razão de proteção ambiental. 4. Existe o direito de corte de vegetação protegida em processo de regeneração, desde que em lotes de terrenos destinados à construção civil, mas deve ser exercitado nos limites estabelecidos pela legislação federal. 5. A sanção administrativa deve ficar circunscrita à parte que realmente atingiu a área de proteção ambiental (dois blocos), sob pena de excesso do poder de polícia administrativa, com violação ao princípio da proporcionalidade. (TRF4, ACMS n. 9604256858/ SC, Juiz José Luiz B. Germano Da Silva).
Também no sentido de que devem ser resguardadas as APPs:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO DE PROPRIEDADE. RESTRIÇÕES. ÁREA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL. ITAIMBÉZINHO. A Carta Política de 1988 limitou o direito de propriedade que deve atender a sua função social, entre eles, a preservação do meio ambiente (art. 186, II, da CF), resguardando os interesses da coletividade. É dever do Poder Público preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais (art. 225, § 1º, I, da CF), sendo correto o ato da autoridade que determina a retirada de animais domésticos, domesticados ou amansados, sejam aborígenes ou alienígenas, que se encontram dentro de área de preservação ambiental. (TRF4, ACMS n. 2000.04.01.009927-0/RS, Juiz Edgard A. Lippmann Junior).
Portanto, o que se vislumbra do presente caso, é o total desrespeito à lei e a sociedade, posto que qualquer dano causado ao meio ambiente, afronta a coletividade e o interesse público.
Atente-se para o fato de que o dano ambiental apresenta características diferentes do dano tradicional, principalmente porque é considerado bem de uso comum do povo, incorpóreo, imaterial, autônomo e insuscetível de apropriação exclusiva.
Desta forma, o dano ambiental pode tanto afetar o interesse da coletividade quanto seus efeitos podem ter reflexo na esfera individual, o que autoriza o indivíduo a exigir a reparação do dano, seja ela patrimonial ou extrapatrimonial. Assim, o dano ambiental tem duas facetas: pode ser produzido ao bem público, neste caso, o titular é a coletividade; e pode ser sofrido por particular enquanto titular do direito fundamental.
Logo, diante de manifesta afronta a lei, é providência necessária a retirada da obra do local da APP.
Vale citar o que a jurisprudência já decidiu à respeito:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA - EDIFICAÇÃO ÀS MARGENS DO RIO DO PEIXE - ALVARÁ CONCEDIDO PELO MUNICÍPIO EM DESACORDO COM O CÓDIGO FLORESTAL. PREPONDERÂNCIA DE NORMA FEDERAL SOBRE NORMA MUNICIPAL - COMPETÊNCIA LEGISLATIVA SUPLEMENTAR - ANULAÇÃO - POSSIBILIDADE - DANO ECOLÓGICO PRESUMIDO - PROVIMENTO DO APELO - SUCUMBENTE ISENTO DA CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS - PROVIMENTO PARCIAL POR MAIORIA - DIVERGÊNCIA APENAS PRECONIZANDO A CONVERSÃO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER (DEMOLIÇÃO DO PRÉDIO) EM INDENIZAÇÃO.
Na proteção ao meio ambiente não se requisita tombamento patrimonial ou dominialidade pública como condição da ação, mas apenas a existência de interesse público na sua preservação. Da mesma forma, basta a probabilidade de dano (visa impedir), não sendo lógico esperar sua ocorrência para depois reprimi-lo" (Ap. cív. n. 98.000924-3, da Capital, Des. Nilton Macedo Machado).(Apelação cível n. 2002.009640-2, de Joaçaba. Relator: Des. Francisco Oliveira Filho. Órgão Julgador: Segunda Câmara de Direito Público. Data Decisão: 02/06/2003)
Ainda:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA - MUNICÍPIO - PREPONDERÂNCIA DE NORMA FEDERAL SOBRE NORMA MUNICIPAL - COMPETÊNCIA LEGISLATIVA SUPLEMENTAR - RECUO MARGINAL ESTABELECIDO PELO CÓDIGO FLORESTAL - ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE INCIDENTER TANTUM - ARTS. 480 C/C 481 DO CPC - EXEGESE - CONTROLE DIFUSO SUSCITADO.(TJSC, Apelação Cível n. 2004.018657-6, de Xanxerê, Rel. Des. Franscisco Oliveira Filho, J. 28/09/2004)
Para tanto, a procedência da demanda é medida, haja vista que o dano efetivamente ocorreu e em níveis que excedem o limite de tolerabilidade, representando verdadeira conduta anti-social.
Quanto à reparação do dano ambiental, temos que o Princípio do poluidor-pagador, inserto nos arts. 4º, VII e 14, § 1º, da Lei n.º. 6.938/1981 e recepcionado pela Constituição Federal de 1988 (art. 225, § 3º), consiste na obrigação do empreendedor em internalizar os custos decorrentes da implantação de mecanismos tendentes a afastar os efeitos maléficos dos danos ao meio ambiente que adviriam do desenvolvimento regular de suas atividades econômicas (Antonio Herman de Vasconcelos e Benjamim. O princípio poluidor-pagador e a reparação do dano ambiental. http://bdjur.stj.gov.br. Acessado em 29/04/2008).
Sendo assim, eficientemente demonstrada a ocorrência de dano ambiental, necessária a sua recuperação ou, no caso de impossibilidade de fazê-lo, o ressarcimento em espécie pelos responsáveis. Para tanto, deve-se ter sempre em mente que na seara do Direito Ambiental a incerteza quanto à agressividade do empreendimento milita em favor do meio ambiente, fato que enseja a inversão do ônus da prova nas demandas dessa natureza e acarreta ao suposto poluidor, por conseqüência, a obrigação de provar que a sua atividade não é perigosa ou poluidora.
De acordo com a Lei 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, poluidor é a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental (art. 3º, inciso IV). Ainda, o mesmo diploma legal conceitua a degradação ambiental como a alteração adversa das características do meio ambiente (inciso II do artigo 3º da citada lei).
Por sua vez, o art. 3º, inciso III, da Lei 6.938/81 define poluição nos seguintes termos:
Poluição – a degradação da qualidade ambiental resultante das atividades que direta ou indiretamente:
a) prejudicam a saúde e o bem estar da população;
b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;
c) afetem desfavoravelmente a biota;
d) afetem as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente;
e) lancem matéria ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos.
Em que pese os autos careçam de prova técnica acerca dos níveis de poluição efetivamente causados no local, no meu entender, há a necessidade de se reparar o dano causado, e mais outros tantos danos, a ponto de se recuperar o equivalente a mais de 100% do dano causado (princípio da precaução), aí também se refletindo um custo financeiro que serve ao propósito punitivo.
Quanto a esse aspecto, "O certo é que a noção de limites de tolerabilidade é válida para a proteção do meio ambiente e cientificamente correta. Ela aparece como condição de existência do dano ambiental, porém, deve ser extraída do conjunto das provas na ação de reparação do dano e não das normas pré-estabelecidas. Ou seja, nem sempre os parâmetros oficiais ajustam-se à realidade sanitária e ambiental, razão pela qual devem ser consideradas as características do meio ambiente e de seus componentes no caso concreto. Somente assim, será possível averiguar a nocividade ou não das substâncias que estão sendo emitidas, possibilitando sua adaptação à níveis de emissão que não afetem negativamente ao meio ambiente." (Dano ambiental. Autor:Silvana Colombo. Texto extraído do Boletim Jurídico - ISSN 1807-9008. http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=1256. Acessado em 29/04/2008.).
Nestes termos, face tratar-se o local de área de preservação permanente, é recomendável a recomposição da mata natural outrora encontrada no local, eis que a vegetação nativa jamais deveria ter sido suprimida do terreno de propriedade do réu.
No caso em comento, a via da recuperação do local atingido é recomendável, seja por viabilizar a recomposição (mesmo que parcial) de um ecossistema em benefício da comunidade, seja pelo caráter educativo junto ao réu e perante à sociedade, tendo em vista a primordial aplicação dos princípios da reparabilidade integral e o da prioridade da restauração natural.
Ademais, a recomposição do patrimônio ambiental lesado "não deve ser embasada nas dificuldades de sua realização pelo degradador, nem tampouco sopesando interesses comerciais, os quais, nesta matéria, devem ser deixados à margem, para a elevação do cuidado e manutenção de um meio ambiente saudável e ecologicamente preservado." (Embargos Infringentes n. 2004.022725-6, de Joaçaba. Relator designado: Des. Newton Trisotto.)
Inviabilizada a restauração do estado anterior ao dano causado, a legislação ambiental prevê a compensação ecológica, que pode ser definida como a substituição do bem lesado por um bem equivalente, desde que o patrimônio natural permaneça inalterado qualitativamente e quantitativamente.
Assim, dois pressupostos estão vinculados à compensação ecológica: primeiro, o dano ambiental deve ser irreparável e segundo, as medidas compensatórias devem guardar relação com o bem degradado (Ana Paula Nogueira da Cruz. A compensação ambiental diante de danos irreparáveis. In: Revista de Direito Ambiental. São Paulo, n.21/2001, p.279).
Desse modo, em que pese a indenização pecuniária se trate de forma de reparação secundária do bem ambiental lesado, é verdadeira medida de compensação ecológica que garante o caráter coercitivo da responsabilidade civil ambiental.
Umas das principais dificuldades encontradas para a reparação integral do dano ambiental é a sua avaliação econômica. Porém, a complexidade da valoração do bem ambiental não significa que os recursos naturais sejam insuscetíveis de avaliação econômica, já que metodologias foram desenvolvidas para a estipulação do quantum debeatur.
Hodiernamente, o parâmetro utilizado é a extensão do dano, valorado pelo custo das medidas de restauração, substituição e aquisição de recursos equivalentes, de maneira a prestigiarem-se os princípios da precaução, do poluidor-pagador, da responsabilidade e o da prevenção.
Nestes termos, observado que trata-se o réu de um vereador, certamente conhecer da legislação ambiental inerente aos seus atos, impõe-se a reparação do dano pelo valor da obra construída, apurada em R$ 40.000,00 (quarenta mil reais). Atenta-se para a gravidade da conduta perpetrada, não somente pelo dano em si como também pela maliciosa tentativa de evadir-se da responsabilização – o que com certeza contribuiu para a majoração do dano – atentando para os princípios de direito ambiental, bem como para o fato de que jamais deve ser lucrativo infringir as normas ambientais. Sublinho, por oportuno, que referido valor está apurado na metragem da obra construída (40m2), calculada esta com base no CUB-Custo Unitário Básico extraído do site do Sindicato dos Engenheiros do Estado de Santa Catarina (http://www.senge-sc.org.br/novosite/index.php?center=tabelacub).
Saliento que referido valor deverá ter como destino o Fundo para a Reconstituição dos Bens Lesados – FRBL, previsto na Lei n. 7.347/85 , e regulamentado, no âmbito do Estado de Santa Catarina, pelo Decreto Estadual n.º 1.047/87.
Referido Fundo, ex vi informação obtida no site do Ministério Público Estadual (http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_06.asp?secao_id= 398), é constituído justamente por receita decorrente de condenações judiciais destinadas à "reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valores artísticos, estéticos, históricos e paisagísticos em todo o território catarinense." No mesmo sítio, há a indicação, inclusive, do CNPJ do Fundo (76.276.849/0001-54) e o número da conta-corrente, a saber, 58.109-0, Agência 068, Banco do Estado de Santa Catarina.
DECIDO.
Ante o exposto, RESOLVO O MÉRITO da Ação Civil Pública com Obrigação de Fazer, proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA em face do ELOI HOFFELDER, JULGANDO PROCEDENTES os pedidos elencados à exordial, o que faço com fulcro no artigo 269, inciso I do Código de Processo Civil, pelos fatos e fundamentos acima lançados, condenando o réu à suportar a demolição da obra e retirar todos os entulhos.
Fixo o prazo de 72 (setenta e duas) horas para o início da medida demolitória, devendo ser o cumprimento da medida devidamente comprovado aos autos no mesmo prazo. Oficie-se a FATMA para que com o auxílio da Polícia Militar Ambiental procedam a demolição.
Condeno o réu ao pagamento de indenização no valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), a ser pago ao Fundo para a Reconstituição dos Bens Lesados – FRBL, CNPJ n.º 76.276.849/0001-54, cujo valor deve ser atualizado (INPC) e acrescido de juros de mora (1%am) a partir da publicação da presente decisão.
Condeno o réu à obrigação de não construir na parte do seu terreno que seja de APP, inclusive realizando o cercamento da área, bem como providenciar o plantio de mudas de árvores nativas – de sorte a recompor o ambiente natural do local -, em toda a área do imóvel construída, intercalando as espécies – processo que deve ser supervisionado pela FATMA – e ficando o réu responsável pela perpetuação e manutenção das mudas plantadas, medida a ser cumprida no prazo de 30 (trinta) dias. Arbitro multa diária no valor de R$ 100,00 (cem reais) para o atraso da obrigação de fazer, a contar do trigésimo primeiro dia da publicação da presente decisão, força do art. 11 da Lei n.º 7.347/85, respeitado o limite da indenização.
Condeno também o réu ao pagamento das custas e demais despesas processuais, inclusive honorários advocatícios que fixo em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), posto não acolher como acertado o entendimento que reza que 'tendo em vista que a propositura da ação civil pública constitui função institucionalizada, uma das razões porque dispensa patrocínio por advogado, não cabe o ônus do pagamento de honorários' (CARVALHO FILHO, José Dos Santos. Ação civil pública. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1995. p. 368). Ora, nada impede ser ressarcido o Estado pelo gasto havido com seu órgão ministerial, pela via da sucumbência, emprestando-se, ademais, tratamento igualitário aos demais réus condenados em processos cíveis comuns, porquanto é inegável que a sucumbência assume feição de sanção aos litigantes em geral, que deram causa a instauração de processos.
Ação: Ação Civil Pública/Lei Especial
Autor: Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Réu: ELoi Hoffelder
SENTENÇA
Vistos, etc.
O MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA, por seu Promotor de Justiça, ingressou com a presente Ação Civil Pública, em desfavor de ELÓI HOFFELDER, alegando, em suma, a construção irregular de obra pelo réu em Área de Preservação Permanente – APP, sem qualquer autorização, permissão, ou consulta aos órgãos ambientais competentes.
Alega que o demandado edificou na Linha Antinha, interior do Município de Joaçaba, construção mista com dois andares de aproximadamente 40 m² de área total a menos de 10 (dez) metros de curso d'água, promovendo destruição de floresta considerada de preservação permanente, sem qualquer autorização de órgão competente.
Dito isto, requereu: a) a citação do réu; b) a procedência do pedido; c) a obrigação do requerido, caso decida-se pela permanência da obra no local investigado, ao tratamento dos efluentes e melhoria da mata ciliar; d) a condenação do requerido ao pagamento de custas e honorários advocatícios. Valorou a causa e acostou documentos.
Citado, contestou o requerido (fls. 51/54), alegando que na época do início da construção descrita à exordial, o plano diretor não exigia projeto e autorização de órgão ambiental competente, pois se tratava de área rural.
Ao final, requereu que seja a obra conservada. Ademais, pugna pela produção de provas.
Réplica vazada às fls. 56/59.
Vieram-me os autos conclusos.
É o relato.
FUNDAMENTO.
O feito comporta julgamento no estado em que se encontra, dispensando a produção de outras provas (art. 330, inciso I, do CPC). Sobre o tema, tem enfatizado o Tribunal de Santa Catarina:
A necessidade da produção de outras, além das já existentes nos autos, se submete à prudente discrição do juiz, impondo-se o julgamento antecipado da lide quando as provas requeridas pelas partes forem absolutamente irrelevantes para o pronunciamento do juízo decisório. (Apelação Cível nº39.999, de Itajaí, rel. Des. Wilson Guarany).
O meio ambiente foi reconhecido como bem jurídico autônomo pelo art. 3º, I, da Lei n.º 6.938/1981, que o definiu como "o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas".
Posteriormente, com o advento do art. 225, caput, da Constituição Federal de 1988, a autonomia jurídica do bem ambiental resultou definitivamente consolidada com a sua qualificação como "bem de uso comum do povo", fato que, por si só, reflete o primordial interesse público na conservação do meio ambiente e na sadia qualidade de vida.
O surgimento do direito ao meio ambiente e dos demais direitos fundamentais de terceira geração é assim explicado pela doutrina:
Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos da terceira geração tendem a cristalizar-se neste fim de século enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um determinado Estado. Têm primeiro por destinatário o gênero humano, mesmo num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade correta. Os publicistas e os juristas já os enumeram com familiaridade, assinalando-lhe o caráter fascinante do coroamento de uma evolução de trezentos anos dos direitos fundamentais. Emergiram eles da reflexão sobre temas referentes ao desenvolvimento à paz, ao meio ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidadeh (Paulo Bonavides. Curso de Direito Constitucional. 19 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 569).
O artigo 225 da Constituição Federal também dispõe que incumbe "ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.". Nesse sentido o preceptivo constitucional inserto no art. 23, caput, VI, que estabelece a solidariedade de todos os entes do Poder Público para a proteção do meio ambiente e o combate a todas as formas de poluição.
A proteção ambiental objetiva a preservação da natureza em todos os elementos necessários à vida e à manutenção do equilíbrio ecológico e social, diante do instinto predatório das atitudes civilizadas que, em nome do desenvolvimento e socialização da humanidade, devastam florestas, distratam o solo, extinguem a fauna, poluem as águas e o ar.
Prima facie, vale citar o que encontra-se estatuído no art. 24, IV da carta Magna Nacional:
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição.
Sobre a legislação do referido artigo, leciona Celso Ribeiro Bastos:
A união fica adstrita à edição de normas gerais, embora nem sempre seja claro em que se distinguem as normas gerais das não gerais. Essa legislação da União não exclui o poder dos Estados e do Distrito Federal, suplementarmente, de disporem sobre a mesma matéria. Deve-se entender por suplementarmente o seguinte: na inexistência de lei federal os Estados e o Distrito Federal legislarão livremente, sem restrições. A sobrevinda, contudo, ou a preexistência de uma lei federal sobre a matéria só tornam válidas as disposições que não contrariem as normas gerais da União (Curso de direito constitucional. 22. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 306).
Servindo como instrumento para que fosse proporcionada segurança ao meio ambiente, foram criados o Código Florestal (Lei 4771/65) e a Lei de Política do Meio Ambiente (nº 6.983/81). Para tanto, estipula o Código Florestal em seu art. 1.º :
Art. 1° As florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de propriedade, com as limitações que a legislação em geral e especialmente esta Lei estabelecem. § 2o Para os efeitos deste Código, entende-se por: II - área de preservação permanente: área protegida nos termos dos arts. 2o e 3o desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.
O artigo 2º do Código Florestal disserta sobre as Áreas de Preservação Permanente, bem como as metragens que construções devem respeitar ao longo dos mananciais, outrossim, mais do que notório que deverá ser esta a legislação adotada para que se resolva a lide. Cabe esclarecer ainda, que a definição para área de preservação permanente, referem-se às áreas situadas ao lado de rios, córregos ou mesmo banhados.
Passando à análise dos autos, verifica-se que a inicial está fundamentada em um Auto de Constatação nº 00258/2008, elaborado pela Polícia Militar Ambiental (fls. 11/14), que acusa como estando irregular a obra de propriedade do réu, posto não possuir autorização tampouco projeto para a edificação.
Reforçando, tem-se o disposto na lei 4.771 de 15 de setembro de 1965, que discorre da seguinte forma:
Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas: a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será: 1 - de 30 (trinta) metros para os cursos d'água de menos de 10 (dez) metros de largura; 2 - de 50 (cinquenta) metros para os cursos d'água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura; 3 - de 100 (cem) metros para os cursos d'água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura; 4 - de 200 (duzentos) metros para os cursos d'água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura; 5 - de 500 (quinhentos) metros para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros.
Se dispõe a alegar o réu que não efetuou nenhum projeto e não pediu autorização à órgão competente, somente pelo fato de não constar no plano diretor da época do início das obras, nenhuma especificação ou empecilho contra a execução da obra no local. Afirma que a construção não agrediu em nada a área e que pretende arborizar ainda mmais o local.
No entanto, improcedentes as alegações do réu, posto que se baseia no que se encontrava em regulamento antigo, seja o plano diretor vigente à época do início das obras, fere visivelmente a hierarquia das leis.
Cabe salientar também, que o Código Florestal é claro ao proibir construção ao leito das áreas de proteção com aplicação, neste caso, art. 2º, "a", 1, que considera como área de preservação distância 'de 30 (trinta) metros para os cursos d'água de menos de 10 (dez) metros de largura" e como se extrai do laudo sobre a ocupação do imóvel às fls. 31/40, o autor edificou sua casa mista à apenas 6 (seis) metros e cinquenta centímetros da margem do córrego, o que por si só, independente de qualquer lei, denota a intenção poluidora do réu, que é vereador.
Em se tratanto das alegações do réu sobre o exposto do plano diretor da época, o Código Florestal faz menção ao plano diretor, em que, onde se tratando de áreas urbanas, podendo ser utilizado o que neste estiver prescrito, mas sempre em observância com o disposto no artigo 2.° do Código Florestal supra mencionado. Ou seja, independente do antigo plano diretor falar ou não sobre a possibilidade da obra na área de proteção, este jamais poderia dispor sobre a possibilidade de construção em área de proteção, inferior aos 30 metros já especificados.
Somente a título de esclarecimento, mesmo o réu tendo projeto para construção e suposto alvará, este seria indevido, posto ser APP. Acerca da impossibilidade da concessão de alvará para a construção em APPs, colhe-se da jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
ADMINISTRATIVO. AUTUAÇÃO EM OBRAS DA CONSTRUÇÃO CIVIL. LICENÇA MUNICIPAL. CÓDIGO FLORESTAL. IBAMA. 1. A fixação de norma relativa à proteção ambiental é matéria de interesse geral e, portanto, de competência legislativa federal. Licença Municipal, como no caso para a construção de condomínio residencial próximo a curso d'água com largura superior a 50 m, não pode extrapolar norma Federal de caráter geral. 2. A alegação de possível ilegalidade existente em outras construções no mesmo local não é capaz de justificar a ilegalidade que originou a atuação do órgão fiscalizador. 3. Presume-se legítima a avaliação da autoridade administrativa em ato praticado em caráter de urgência, como no caso dos autos, cujo embargo administrativo se deu em razão de proteção ambiental. 4. Existe o direito de corte de vegetação protegida em processo de regeneração, desde que em lotes de terrenos destinados à construção civil, mas deve ser exercitado nos limites estabelecidos pela legislação federal. 5. A sanção administrativa deve ficar circunscrita à parte que realmente atingiu a área de proteção ambiental (dois blocos), sob pena de excesso do poder de polícia administrativa, com violação ao princípio da proporcionalidade. (TRF4, ACMS n. 9604256858/ SC, Juiz José Luiz B. Germano Da Silva).
Também no sentido de que devem ser resguardadas as APPs:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO DE PROPRIEDADE. RESTRIÇÕES. ÁREA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL. ITAIMBÉZINHO. A Carta Política de 1988 limitou o direito de propriedade que deve atender a sua função social, entre eles, a preservação do meio ambiente (art. 186, II, da CF), resguardando os interesses da coletividade. É dever do Poder Público preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais (art. 225, § 1º, I, da CF), sendo correto o ato da autoridade que determina a retirada de animais domésticos, domesticados ou amansados, sejam aborígenes ou alienígenas, que se encontram dentro de área de preservação ambiental. (TRF4, ACMS n. 2000.04.01.009927-0/RS, Juiz Edgard A. Lippmann Junior).
Portanto, o que se vislumbra do presente caso, é o total desrespeito à lei e a sociedade, posto que qualquer dano causado ao meio ambiente, afronta a coletividade e o interesse público.
Atente-se para o fato de que o dano ambiental apresenta características diferentes do dano tradicional, principalmente porque é considerado bem de uso comum do povo, incorpóreo, imaterial, autônomo e insuscetível de apropriação exclusiva.
Desta forma, o dano ambiental pode tanto afetar o interesse da coletividade quanto seus efeitos podem ter reflexo na esfera individual, o que autoriza o indivíduo a exigir a reparação do dano, seja ela patrimonial ou extrapatrimonial. Assim, o dano ambiental tem duas facetas: pode ser produzido ao bem público, neste caso, o titular é a coletividade; e pode ser sofrido por particular enquanto titular do direito fundamental.
Logo, diante de manifesta afronta a lei, é providência necessária a retirada da obra do local da APP.
Vale citar o que a jurisprudência já decidiu à respeito:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA - EDIFICAÇÃO ÀS MARGENS DO RIO DO PEIXE - ALVARÁ CONCEDIDO PELO MUNICÍPIO EM DESACORDO COM O CÓDIGO FLORESTAL. PREPONDERÂNCIA DE NORMA FEDERAL SOBRE NORMA MUNICIPAL - COMPETÊNCIA LEGISLATIVA SUPLEMENTAR - ANULAÇÃO - POSSIBILIDADE - DANO ECOLÓGICO PRESUMIDO - PROVIMENTO DO APELO - SUCUMBENTE ISENTO DA CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS - PROVIMENTO PARCIAL POR MAIORIA - DIVERGÊNCIA APENAS PRECONIZANDO A CONVERSÃO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER (DEMOLIÇÃO DO PRÉDIO) EM INDENIZAÇÃO.
Na proteção ao meio ambiente não se requisita tombamento patrimonial ou dominialidade pública como condição da ação, mas apenas a existência de interesse público na sua preservação. Da mesma forma, basta a probabilidade de dano (visa impedir), não sendo lógico esperar sua ocorrência para depois reprimi-lo" (Ap. cív. n. 98.000924-3, da Capital, Des. Nilton Macedo Machado).(Apelação cível n. 2002.009640-2, de Joaçaba. Relator: Des. Francisco Oliveira Filho. Órgão Julgador: Segunda Câmara de Direito Público. Data Decisão: 02/06/2003)
Ainda:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA - MUNICÍPIO - PREPONDERÂNCIA DE NORMA FEDERAL SOBRE NORMA MUNICIPAL - COMPETÊNCIA LEGISLATIVA SUPLEMENTAR - RECUO MARGINAL ESTABELECIDO PELO CÓDIGO FLORESTAL - ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE INCIDENTER TANTUM - ARTS. 480 C/C 481 DO CPC - EXEGESE - CONTROLE DIFUSO SUSCITADO.(TJSC, Apelação Cível n. 2004.018657-6, de Xanxerê, Rel. Des. Franscisco Oliveira Filho, J. 28/09/2004)
Para tanto, a procedência da demanda é medida, haja vista que o dano efetivamente ocorreu e em níveis que excedem o limite de tolerabilidade, representando verdadeira conduta anti-social.
Quanto à reparação do dano ambiental, temos que o Princípio do poluidor-pagador, inserto nos arts. 4º, VII e 14, § 1º, da Lei n.º. 6.938/1981 e recepcionado pela Constituição Federal de 1988 (art. 225, § 3º), consiste na obrigação do empreendedor em internalizar os custos decorrentes da implantação de mecanismos tendentes a afastar os efeitos maléficos dos danos ao meio ambiente que adviriam do desenvolvimento regular de suas atividades econômicas (Antonio Herman de Vasconcelos e Benjamim. O princípio poluidor-pagador e a reparação do dano ambiental. http://bdjur.stj.gov.br. Acessado em 29/04/2008).
Sendo assim, eficientemente demonstrada a ocorrência de dano ambiental, necessária a sua recuperação ou, no caso de impossibilidade de fazê-lo, o ressarcimento em espécie pelos responsáveis. Para tanto, deve-se ter sempre em mente que na seara do Direito Ambiental a incerteza quanto à agressividade do empreendimento milita em favor do meio ambiente, fato que enseja a inversão do ônus da prova nas demandas dessa natureza e acarreta ao suposto poluidor, por conseqüência, a obrigação de provar que a sua atividade não é perigosa ou poluidora.
De acordo com a Lei 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, poluidor é a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental (art. 3º, inciso IV). Ainda, o mesmo diploma legal conceitua a degradação ambiental como a alteração adversa das características do meio ambiente (inciso II do artigo 3º da citada lei).
Por sua vez, o art. 3º, inciso III, da Lei 6.938/81 define poluição nos seguintes termos:
Poluição – a degradação da qualidade ambiental resultante das atividades que direta ou indiretamente:
a) prejudicam a saúde e o bem estar da população;
b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;
c) afetem desfavoravelmente a biota;
d) afetem as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente;
e) lancem matéria ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos.
Em que pese os autos careçam de prova técnica acerca dos níveis de poluição efetivamente causados no local, no meu entender, há a necessidade de se reparar o dano causado, e mais outros tantos danos, a ponto de se recuperar o equivalente a mais de 100% do dano causado (princípio da precaução), aí também se refletindo um custo financeiro que serve ao propósito punitivo.
Quanto a esse aspecto, "O certo é que a noção de limites de tolerabilidade é válida para a proteção do meio ambiente e cientificamente correta. Ela aparece como condição de existência do dano ambiental, porém, deve ser extraída do conjunto das provas na ação de reparação do dano e não das normas pré-estabelecidas. Ou seja, nem sempre os parâmetros oficiais ajustam-se à realidade sanitária e ambiental, razão pela qual devem ser consideradas as características do meio ambiente e de seus componentes no caso concreto. Somente assim, será possível averiguar a nocividade ou não das substâncias que estão sendo emitidas, possibilitando sua adaptação à níveis de emissão que não afetem negativamente ao meio ambiente." (Dano ambiental. Autor:Silvana Colombo. Texto extraído do Boletim Jurídico - ISSN 1807-9008. http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=1256. Acessado em 29/04/2008.).
Nestes termos, face tratar-se o local de área de preservação permanente, é recomendável a recomposição da mata natural outrora encontrada no local, eis que a vegetação nativa jamais deveria ter sido suprimida do terreno de propriedade do réu.
No caso em comento, a via da recuperação do local atingido é recomendável, seja por viabilizar a recomposição (mesmo que parcial) de um ecossistema em benefício da comunidade, seja pelo caráter educativo junto ao réu e perante à sociedade, tendo em vista a primordial aplicação dos princípios da reparabilidade integral e o da prioridade da restauração natural.
Ademais, a recomposição do patrimônio ambiental lesado "não deve ser embasada nas dificuldades de sua realização pelo degradador, nem tampouco sopesando interesses comerciais, os quais, nesta matéria, devem ser deixados à margem, para a elevação do cuidado e manutenção de um meio ambiente saudável e ecologicamente preservado." (Embargos Infringentes n. 2004.022725-6, de Joaçaba. Relator designado: Des. Newton Trisotto.)
Inviabilizada a restauração do estado anterior ao dano causado, a legislação ambiental prevê a compensação ecológica, que pode ser definida como a substituição do bem lesado por um bem equivalente, desde que o patrimônio natural permaneça inalterado qualitativamente e quantitativamente.
Assim, dois pressupostos estão vinculados à compensação ecológica: primeiro, o dano ambiental deve ser irreparável e segundo, as medidas compensatórias devem guardar relação com o bem degradado (Ana Paula Nogueira da Cruz. A compensação ambiental diante de danos irreparáveis. In: Revista de Direito Ambiental. São Paulo, n.21/2001, p.279).
Desse modo, em que pese a indenização pecuniária se trate de forma de reparação secundária do bem ambiental lesado, é verdadeira medida de compensação ecológica que garante o caráter coercitivo da responsabilidade civil ambiental.
Umas das principais dificuldades encontradas para a reparação integral do dano ambiental é a sua avaliação econômica. Porém, a complexidade da valoração do bem ambiental não significa que os recursos naturais sejam insuscetíveis de avaliação econômica, já que metodologias foram desenvolvidas para a estipulação do quantum debeatur.
Hodiernamente, o parâmetro utilizado é a extensão do dano, valorado pelo custo das medidas de restauração, substituição e aquisição de recursos equivalentes, de maneira a prestigiarem-se os princípios da precaução, do poluidor-pagador, da responsabilidade e o da prevenção.
Nestes termos, observado que trata-se o réu de um vereador, certamente conhecer da legislação ambiental inerente aos seus atos, impõe-se a reparação do dano pelo valor da obra construída, apurada em R$ 40.000,00 (quarenta mil reais). Atenta-se para a gravidade da conduta perpetrada, não somente pelo dano em si como também pela maliciosa tentativa de evadir-se da responsabilização – o que com certeza contribuiu para a majoração do dano – atentando para os princípios de direito ambiental, bem como para o fato de que jamais deve ser lucrativo infringir as normas ambientais. Sublinho, por oportuno, que referido valor está apurado na metragem da obra construída (40m2), calculada esta com base no CUB-Custo Unitário Básico extraído do site do Sindicato dos Engenheiros do Estado de Santa Catarina (http://www.senge-sc.org.br/novosite/index.php?center=tabelacub).
Saliento que referido valor deverá ter como destino o Fundo para a Reconstituição dos Bens Lesados – FRBL, previsto na Lei n. 7.347/85 , e regulamentado, no âmbito do Estado de Santa Catarina, pelo Decreto Estadual n.º 1.047/87.
Referido Fundo, ex vi informação obtida no site do Ministério Público Estadual (http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_06.asp?secao_id= 398), é constituído justamente por receita decorrente de condenações judiciais destinadas à "reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valores artísticos, estéticos, históricos e paisagísticos em todo o território catarinense." No mesmo sítio, há a indicação, inclusive, do CNPJ do Fundo (76.276.849/0001-54) e o número da conta-corrente, a saber, 58.109-0, Agência 068, Banco do Estado de Santa Catarina.
DECIDO.
Ante o exposto, RESOLVO O MÉRITO da Ação Civil Pública com Obrigação de Fazer, proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA em face do ELOI HOFFELDER, JULGANDO PROCEDENTES os pedidos elencados à exordial, o que faço com fulcro no artigo 269, inciso I do Código de Processo Civil, pelos fatos e fundamentos acima lançados, condenando o réu à suportar a demolição da obra e retirar todos os entulhos.
Fixo o prazo de 72 (setenta e duas) horas para o início da medida demolitória, devendo ser o cumprimento da medida devidamente comprovado aos autos no mesmo prazo. Oficie-se a FATMA para que com o auxílio da Polícia Militar Ambiental procedam a demolição.
Condeno o réu ao pagamento de indenização no valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), a ser pago ao Fundo para a Reconstituição dos Bens Lesados – FRBL, CNPJ n.º 76.276.849/0001-54, cujo valor deve ser atualizado (INPC) e acrescido de juros de mora (1%am) a partir da publicação da presente decisão.
Condeno o réu à obrigação de não construir na parte do seu terreno que seja de APP, inclusive realizando o cercamento da área, bem como providenciar o plantio de mudas de árvores nativas – de sorte a recompor o ambiente natural do local -, em toda a área do imóvel construída, intercalando as espécies – processo que deve ser supervisionado pela FATMA – e ficando o réu responsável pela perpetuação e manutenção das mudas plantadas, medida a ser cumprida no prazo de 30 (trinta) dias. Arbitro multa diária no valor de R$ 100,00 (cem reais) para o atraso da obrigação de fazer, a contar do trigésimo primeiro dia da publicação da presente decisão, força do art. 11 da Lei n.º 7.347/85, respeitado o limite da indenização.
Condeno também o réu ao pagamento das custas e demais despesas processuais, inclusive honorários advocatícios que fixo em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), posto não acolher como acertado o entendimento que reza que 'tendo em vista que a propositura da ação civil pública constitui função institucionalizada, uma das razões porque dispensa patrocínio por advogado, não cabe o ônus do pagamento de honorários' (CARVALHO FILHO, José Dos Santos. Ação civil pública. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1995. p. 368). Ora, nada impede ser ressarcido o Estado pelo gasto havido com seu órgão ministerial, pela via da sucumbência, emprestando-se, ademais, tratamento igualitário aos demais réus condenados em processos cíveis comuns, porquanto é inegável que a sucumbência assume feição de sanção aos litigantes em geral, que deram causa a instauração de processos.
Em caso de apelação, atente-se que eventual efeito suspensivo recursal, em prejuízo da eficácia desta sentença, deve ser concedido motivadamente (art. 14 da Lei n.º 7.347/85).
Publique-se. Registre-se. Intime-se.
Joaçaba (SC), 16 de março de 2010
Fernando Cordioli Garcia
Juiz Substituto
Fonte:
http://esaj.tjsc.jus.br/pastadigital/abrirDocumentoEdt.do?origemDocumento=M&nuProcesso=037.09.004930-2&cdProcesso=110001KMJ0000&cdForo=37&tpOrigem=1&flOrigem=P&nmUrlWebService=http%3A%2F%2Fjoacaba.tj.sc.gov.br%3A8080%2FcpoWSPG%2Fservices%2F&nmAlias=OJCA&cdServico=190101&ticket=EMhBu54hFMmm1Hr29kH3QWOVUCMQPYuNhCjHFyYGatme5Ojj%2BqzkkcFl6joCUrQOhKHLbc682qy2hpkBvBR9WmeajKUpAor3L0cCehwjB2Gf%2F8h%2FioMKNft856tM5kL9%2BDXhg9Va7KE3UswaXh7UgV8NKL4oa5oJBCK2FugI05OnW%2FtqAFFUqm%2FXofNNNz%2BYYrjICBC98AJ%2FaWa4V0hMvg%3D%3D#
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