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terça-feira, 10 de novembro de 2015

Reciclagem de resíduos da cadeia produtiva do pescado poderá viabilizar coprodutos

A professora Marilia Oetterer, do Departamento de Agroindústria, Alimentos e Nutrição da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba, coordena pesquisas que procuram reciclar resíduos do processamento de pescado visando obter coprodutos com valor agregado.
Desperdícios e resíduos do pescado chegam a representar 70% do total da produção em todo o mundo. A coleta seletiva dos resíduos é possível obter óleo, farinha, concentrado e hidrolisado proteico, silagem, adubo, ração, minerais, entre outros

Com esse propósito trabalha a equipe do Grupo de Estudo e Extensão em Inovação Tecnológica e Qualidade do Pescado (Getep), coordenado pela professora Marilia. “Os estudos buscam a sustentabilidade da cadeia produtiva, a minimização do impacto ambiental e o aumento da receita na empresa processadora”, complementa a docente. Segundo a coordenadora do Getep, ao selecionar os resíduos é possível obter frações mais específicas, o que possibilita a obtenção de coprodutos de maior valor. “A silagem é uma forma pouco onerosa, independente de escala, que utiliza para a sua elaboração, as próprias enzimas tissulares [da pele e dos tecidos] e das vísceras do pescado e que pode se constituir em fonte proteica para a alimentação animal. Em contraparte, o hidrolisado proteico exige a utilização de enzimas específicas e um processo controlado.”

Uma dessas pesquisas foi desenvolvida pela bióloga Taciana Lunelli no Programa de Pós-graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos (PPG-CTA). O objetivo foi elaborar e caracterizar hidrolisados proteicos de cabeças de tilápia (Oreochromis niloticus), e aferir a atividade antioxidante deste coproduto. “O hidrolisado proteico foi obtido por hidrólise enzimática e empregando as enzimas Neutrase (Protemax NP-800), Papaína (Brauzyn-100) e Pepsina”, detalha Taciana. Os resultados apontaram que as propriedades observadas nos hidrolisados indicam que este pode ser um potencial suplemento alimentício. “Além de apresentar fácil e rápida elaboração, servem como fonte rica de proteína, aditivos para conservação de alimentos e, também, na indústria farmacêutica”, complementa a autora do estudo.

Substrato utilizado em análises laboratoriais para fins de diagnóstico, a peptona pode ter, a partir de outro estudo desenvolvido no Getep, uma alternativa natural. A autora é Ligianne Din Sirahigue Viani, que propôs em seu doutorado, defendido no Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA) da USP, frações aquosas obtidas das silagens de tilápia e beijupirá. “Essas porções podem ser convertidas em peptonas a partir do fracionamento seguido de liofilização”, explica. Ainda segundo Ligianne, o processo para obtenção de silagem mostrou-se simples e de fácil manuseio, não exigindo equipamentos e procedimentos custosos. “A peptona obtida tanto a partir da tilápia quanto do beijupirá revelou-se alternativa viável, à peptona comercial, uma vez que esses coprodutos apresentaram-se estáveis à temperatura ambiente; o pH próximo de 4, garante a qualidade do coproduto pelo período de 40 dias de armazenamento”.

Coleta seletiva

A professora Marília conta ainda que a coleta seletiva pode otimizar o coproduto a se obter. “Coprodutos também estão sendo elaborados com o reaproveitamento da água gerada no processamento para obtenção de CMS- carne mecanicamente separada e elaboração de Minced, que por sua vez é matéria prima para obtenção de nuggets, embutidos, salsichas, entre outros produtos de vida útil extensa e considerados de conveniência atendendo mercado emergente.”

Nessa linha segue o trabalho da cientista de alimentos Suzan Blima Paulino Leite, que faz seu mestrado também no CENA, com orientação da coordenadora do Getep. Suzan ainda está nas etapas de análise, mas revela o que motivou o estudo. “O grande volume de resíduo líquido no processamento industrial de Minced, que pode ser descartado no ambiente sem qualquer tratamento despertou meu interesse. Esse resíduo tem grande potencial para se tornar um coproduto em razão da quantidade e qualidade dos peptídeos presentes.”

O projeto está em desenvolvimento, e as atividades estão sendo realizadas no Laboratório de Qualidade e Inovação Tecnológica de Pescado, com colaboração de outros laboratórios do departamento de Agroindústria, Alimentos e Nutrição. Também são vinculados ao projeto do mestrado, alunos de iniciação científica e de trabalho de conclusão de curso, pertencentes ao curso de graduação em Ciências dos Alimentos da Esalq. “Esta pesquisa trará benefícios ambientais e econômicos ao setor industrial, colaborando para a sustentabilidade da cadeia produtiva do pescado, devido ao reaproveitamento da água residual do processamento de Minced, e a elaboração de coproduto de ótimo valor agregado, que poderá ser grande interesse a indústria farmacêutica e alimentícia”, finaliza.

Esta linha de pesquisa coordenada na Esalq pela professora Marília Oetterer iniciou-se com o financiamento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) via edital Ciências do Mar, com parceria com a Universidade do Porto e com o Instituto Português de Ciências do Mar, com a participação do professor Paulo Vaz Pires. A pesquisa pioneira foi a tese de doutorado no Cena, da pesquisadora Lia Ferraz de Arruda Sucasas, gerada no programa de mobilidade estudantil Santander.

Os trabalhos realizados também contam com fomento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), além de várias bolsas de mobilidade estudantil. Além das pesquisas citadas nessa reportagem, há a de doutorado em andamento no PPG-CTA de Márcia Harada, pesquisadora do Ital, dos mestrados já realizados de Lika Anbe e Werner Martins; além da iniciação científica de Aline Camargo e Tatiane Martins. Com apoio da Fapesp, em agosto deste ano, a bióloga e supervisora do Getep, Juliana Galvão, esteve em Montpellier, na França, divulgando estes resultados no congresso internacional Aquaculture 2015.

Fonte: EcoDebate

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