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quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Contaminação Da Biodiversidade Por Transgênicos, Parte 5/6, Artigo De Roberto Naime

NODARI et. al. (2010) dizem que ao contrario de contribuir, os transgênicos reduzem as inovações e a manutenção dos conhecimentos das comunidades locais e indígenas limitando práticas como a troca e a seleção de sementes.


Os transgênicos podem precipitar a perda de conhecimento tradicional pela dependência da compra de sementes e insumos associados. Isto poderia causar uma mudança drástica em termos de sustentabilidade e estabilidade das comunidades locais e indígenas, decorrente da insegurança alimentar, conforme NODARI et. al. (2010).

No México, por exemplo, mesmo que não tenha sido liberado o cultivo comercial de milho transgênico, devido à existência de extensas áreas com populações ancestrais e parentes silvestres de espécies cultivadas, os transgenes chegaram lá.

A primeira constatação foi verificada ainda em 2001 (QUIST e CHAPELA, 2001). Após muitas tentativas de desmentir o fato, vários estudos posteriores comprovaram não só a contaminação na província de Oaxaca, mas também em outras regiões do México (CLEVELAND et al., 2005 e PIÑEYRO-NELSON et al., 2009).

Mais recentemente, a contaminação genética foi detectada no Peru, que é o segundo grande centro de diversidade genética do milho no mundo (GUTIÉRREZ-ROSATI et al., 2008).

Nas regiões de ocorrência natural de alta diversidade genética de uma espécie ou espécies afins, como é o caso de algodão no Brasil (Brasil, 2006), o cultivo de plantas transgênicas destas espécies merece análise mais rigorosa.

O Brasil é ainda berço de várias espécies cultivadas ou apresenta regiões com alta variabilidade genética nas populações crioulas ainda em cultivo (ex: milho, feijão, mamão e muitas outras), situação esta que requer muita cautela. Como avaliar adequadamente este tipo de risco é sem dúvida um grande desafio.

Além da soja aprovada em 1998 pela CTNBio sem que nenhum estudo de impacto ambiental tivesse sido feito no país. Outros três casos foram disputados no Conselho Nacional de Biossegurança e em processos judiciais, ainda pendente de decisão final. Em 2008 o CNBS decidiu não dar provimento aos recursos do IBAMA (nos dois primeiros casos) e da ANVISA (todos os três) contra a decisão da CTNBio de liberar os milhos transgênicos.

Dentre as razões apresentadas, cabe destacar a ausência de normas efetivas de monitoramento e de coexistência, a não realização de estudos suficientes para assegurar que não haverá danos ao meio ambiente, notadamente em ecossistemas brasileiros, apresentação de estudos inconclusivos ou sem sustentação científica com baixa qualidade dos dados aportados e afirmativas sem comprovação científica.

Também não se apresenta dados ou informações solicitadas, e não se inclui dados da literatura científica obtidos por pesquisadores independentes. A insuficiência dos dados apresentados pelos proponentes para garantir a segurança alimentar e a insuficiência de dados sobre a caracterização do produto de expressão gênica também se registra.

Na análise dos riscos dos transgênicos está sendo ignorada ainda uma realidade fundamental, o pólen ou a semente de milho podem ser carregados por vetores (vento, insetos, animais, homem) até vários quilômetros (EMBERLIN, 1999; REUTER et al., 2008; HEINEMANN, 2007 e HOYLE e CRESSWELL, 2007).

Segundo o professor Walter Fehr, da Iowa State University, “não é somente o que você faz. É também o que seu vizinho faz”, ressaltando que “agricultura é vizinhança”, quando se trata de identificação, segregação e rotulagem de cultivos transgênicos (Declaração ao jornal Washington Bureau, 01/10/2000).

Este alerta é corroborado por vários episódios de contaminação de lavouras de milho com pólen de milho transgênico. Alguns destes casos estão sendo analisados pela justiça de vários países.

Para que se pare de discutir puerilidades como velocidade dos ventos, áreas de isolamento ou de refúgio. Não tem como fugir desta afirmação. Quando a gente se pega discutindo os fatores científicos que controlam o vento, isto inspira uma sensação de regressão aos nossos antecessores na escala evolutiva.

Mas esta coexistência sem contaminação é praticamente impossível por várias razões. A primeira delas refere-se as grandes distâncias alcançadas pelo pólen ou sementes, conforme já mencionado acima.

A segunda razão refere-se ao fato da troca de sementes entre agricultores e às vezes, seguida de mistura ou cruzamentos entre variedades, onde os agricultores esperam variantes para poder fazer as inovações. No entanto, uma parcela deles, ou seja, nem todos, visando manter certa pureza varietal, utiliza estratégias de isolamento para proteger variedades, consideradas de alto valor.

Na Região Oeste de Santa Catarina 28 de 85 agricultores entrevistados não usam estratégias de isolamento e 14% tem distâncias superiores a 400 metros (CORDEIRO et al., 2008). Neste mesmo estudo, os agricultores familiares demonstram consciência das variedades plantadas na circunvizinhança bem como do potencial de contaminação das mesmas.

Neste contexto, a CTNBio para permitir a coexistência, estabeleceu que a distância entre uma lavoura comercial de milho geneticamente modificado e outra de milho não geneticamente modificado, localizada em área vizinha, deve ser igual ou superior a 100 (cem) metros ou, alternativamente, 20 metros, desde que acrescida de bordadura com, no mínimo, 10 fileiras de plantas de milho convencional (Resolução Normativa n° 4, de 16 de agosto de 2007, CTNBio).

No entanto, conforme já demonstrado, esta resolução é absolutamente inócua. Não só as distâncias não impedem a polinização cruzada, nem tampouco a norma obriga a segregação de sementes.

O contexto exposto demonstra a grande relevância da diversidade genética construída e mantida pelos agricultores, pois eles contribuem para manter ou aumentar a diversidade da dieta por meio da promoção do uso em maior escala de várias espécies alimentícias, tanto para o consumo próprio dos agricultores, bem como em oferecê-los à população urbana.

Nesta reflexão aqui feita, os indícios são muito fortes de que a sociedade global vive hoje o alto risco de ver abalado um dos pilares de sua sobrevivência, que são os bens e serviços prestados pelos recursos genéticos que constituem um dos componentes da biodiversidade.

Para tanto, a sociedade não necessita promover a destruição ou simplificação ao extremo dos sistemas naturais ou agroecologicamente manejados. Ao contrario, a ciência e a tecnologia, bem como as políticas públicas, podem encontrar maneiras de manejar os agroecossistemas e a biodiversidade agrícola utilizando os princípios e processos agroecológicos.

Uma das formas disso acontecer é fazer com que a “indústria de matéria prima” volte a ser agricultura, pois frente a essas ameaças, as comunidades agrícolas tradicionais e povos indígenas podem ser parte da eficaz mitigação e adaptação, já que tem diferentes materiais genéticos em cultivo e podem encontrar mais maneiras de manejar os agroecossistemas e a biodiversidade agrícola utilizando os princípios e processos agroecológicos, que garantem a sustentabilidade, manejando, conservando e amplificando a agrobiodiversidade.

No entanto isto só faz sentido se o fluxo dos transgenes para as variedades crioulas for imediatamente interrompido, pois qualquer outra atitude, incentivo ou estratégia será inócua, se as contaminações continuarem a destruir este patrimônio genético.

Por fim, é importante mencionar que a perversidade dos transgênicos melhor se manifesta para aqueles que não querem utilizá-los.

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Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.

Fonte: EcoDebate

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