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segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

A água que nós bebemos, artigo de Montserrat Martins

Um juiz federal liberou a Samarco de fornecer 2 litros de água diária a cada morador de Colatina, ES, foz do Rio Doce, dizendo que o rio já estaria “potável” 3 meses após a contaminação mineral. Essa empresa, a Vale e a BHP (as controladoras da Samarco) aceitaram acordo de indenização de 20 bilhões (seu lucro anual beirava os 3 bilhões) para recuperar a bacia do Rio Doce num prazo de 10 anos. Quanto tempo leva, afinal, para se recuperar um rio contaminado por resíduos metálicos?


A contaminação da água por metais ocorre em todo o país e é um dos fatores causadores de câncer, embora você não ouça falar disso na mídia habitualmente. Um levantamento de quase 100 rios em 7 estados brasileiros mostrou que apenas 11% se mantém com águas limpas. Esgotos domésticos, efluentes industriais, alguns com metais pesados, poluentes orgânicos persistentes e o lixo das mais diversas origens são fontes de poluição.

O problema dos metais na água, que não costuma se divulgado, é que partículas deles persistem mesmo após os métodos de tratamento desta. É ilusório achar que água tratada recupera sua pureza, pois há resíduos metálicos mesmo após o emprego dos melhores sistemas de limpeza. E são justamente esses resíduos que afetam a sua saúde, contribuindo para um aumento significativo dos casos de câncer nas metrópoles.

A tragédia do Rio Doce deveria servir de alerta para o problema da qualidade da água, para mais além dos casos de contaminação evidentes. Surreal o desconhecimento de um magistrado federal capixaba capaz de acreditar que em poucos meses um rio poderia se recuperar. O problema dos mais de 200 milhões de brasileiros está na contaminação invisível das águas que não estão nas manchetes dos telejornais.

É um progresso debatermos tão abertamente a corrupção quanto as escalações dos times de futebol. Mas nem só de corrupção se mata um povo, de negligência também. Houve negligência por falta de barreiras sanitárias contra o Aedes Aegypte ? Com a contaminação de 89% dos nossos rios, está havendo grave negligência nessa área.

Enquanto a água que bebemos não for assunto corrente, enquanto acharmos que as técnicas de limpeza resolvem tudo, enquanto não se divulgam abertamente as correlações entre câncer e outras doenças (como alergias) com a poluição, nossa saúde sofrerá em silêncio. Vivemos esses riscos por uma ignorância coletiva de algo tão fundamental quanto a qualidade da água que nós bebemos.

Montserrat Martins, Colunista do Portal EcoDebate, é médico psiquiatra, bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais e ex-presidente do IGS – Instituto Gaúcho da Sustentabilidade.

Fonte: EcoDebate

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