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segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Atenção seletiva, artigo de Montserrat Martins

“News satire” é um tipo de humor em ascensão, nos Estados Unidos há mais de sessenta sites que participam de um concurso anual sobre a melhor notícia satírica. No Brasil temos o Sensacionalista, na internet e no canal multishow, no sul temos O Bairrista. Pois um dos melhores vídeos do Sensacionalista – um jornal isento de verdade – é sobre “audição seletiva”: pesquisas científicas comprovam que os maridos tem audição seletiva, só ouvem o que querem. Produzida como se fosse verídica, a “reportagem” mostra esse problema na vida dos casais, “entrevista” esposas, maridos e pesquisadores.

A graça é que as sátiras são baseadas em fatos reais: todos nós vivemos, com alguma frequência, situações de atenção seletiva. Se temos um problema de saúde na família nos ligamos em todas notícias sobre saúde, se o problema é na escola ficamos atentos ao mundo escolar, se temos uma atividade social queremos que todos participem, se nosso time tem um jogo importante tudo lembra futebol, quem se apaixona vê aquela pessoa em todos os assuntos – e por aí vai.

Não é um transtorno, é absolutamente natural a atenção seletiva. Não ficamos planejando prestar atenção em alguns assuntos e ignorar outros, mas é isso que ocorre. Isso não acontece só na vida individual de cada um de nós, também as instituições tem formas de atenção seletiva.

Dias atrás, por exemplo, na justiça eleitoral foi levantada uma suspeita sobre as fichas de apoio à criação do partido Rede Sustentabilidade. Entre trinta partidos no país, criados com centenas de milhares de fichas de apoio, é a primeira vez que temos esse tipo de notícia. Que impressiona por falar em “fraude”, supondo má-fé de quem apresentou fichas que não corresponderiam à assinatura do apoiador. A rede já se pronunciou em nota apoiando as investigações, para esclarecimento dos fatos – sabendo-se que há pressões políticas contra possíveis apoiadores, já que o novo partido de Marina Silva é o único que ameaça, segundo as pesquisas, a reeleição da presidenta.

Tive oportunidade de participar da coleta e processamento de fichas da Rede e compreendi como é difícil identificar os eleitores que assinam seu apoio à criação de um partido político. Como ninguém traz o número do título eleitoral em mãos, tem de ser usado um programa da própria justiça eleitoral para identificação dos dados do eleitor. E ali existem homônimos, ou pessoas com nomes semelhantes, cujos dados podem ser cadastrados na ficha em que outro assinou. Em princípio, o risco seria apenas o cartório não reconhecer a assinatura e o apoio não ser validado. Daí a presumir má-fé ou fraude, tem uma grande diferença.

É praticamente impossível que em meio milhão de assinaturas necessárias para esse registro não ocorra algum caso de identificação errada, por troca de nome de apoiadores, no processamento das fichas. Estão aí os registros de todos os partidos, com grandes percentuais de fichas rejeitadas pelos cartórios, para comprovar isso. Quer dizer, mover um processo por “fraude”, como se alguém precisasse falsificar assinaturas de apoio para a Rede, é no mínimo um exagero. Um zelo e uma pressuposição de má-fé sem precedentes, porque nunca alegada para trinta partidos anteriores. Se fossemos pressupor má-fé, teríamos de incluir também hipóteses de infiltrações e boicotes por terceiros interessados. Enfim, se eu fosse redator de um desse sites de “news satire”, minha manchete satírica dessa atenção seletiva seria algo do tipo “Neto de Marina discute com professora e pega recuperação numa matéria”.

Montserrat Martins, Colunista do Portal EcoDebate, é Psiquiatra.

Fonte: EcoDebate

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