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terça-feira, 5 de agosto de 2014

A Política Nacional de Resíduos Sólidos no início ou no fim das soluções ‘definitivas’, artigo de Antonio Silvio Hendges

Há quatro anos, em 02 de agosto de 2010 foi publicada a Lei 12.305 que estabeleceu no Brasil a Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS, regulamentada em 23 de dezembro do mesmo ano pelo Decreto 7.404.
Estes dois dispositivos legais institucionalizaram os princípios, objetivos, instrumentos e diretrizes para a gestão dos resíduos sólidos no país, orgânicos e inorgânicos, urbanos e rurais, com origem no consumo diário, comerciais, industriais, construção civil, saúde, agrossilvopastoris, transportes, mineração, limpeza urbana, saneamento básico, resíduos perigosos, com o prazo de quatro anos para a adequação dos Estados e municípios através da elaboração de planos estaduais, municipais e regionais que priorizem a não geração, redução, reutilização, reciclagem, tratamento e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos e consequentemente, a extinção dos lixões e descartes inadequados. Este prazo – para erradicação dos lixões e destinação final para aterros sanitários apenas dos rejeitos – terminou em 02 de agosto de 2014.

Também foram atribuídas responsabilidades aos diversos agentes econômicos relacionados à produção de resíduos, estabelecendo-se a obrigatoriedade de planos específicos de gestão dos resíduos relacionados com a produção, distribuição, armazenagem e comercialização dos produtos, suas embalagens e itens obsoletos, institucionalizando-se a obrigatoriedade da logística reversa, dos acordos setoriais e dos termos de compromisso entre as empresas e os poderes públicos, atribuindo-se igualmente responsabilidades específicas aos consumidores. Como exemplo: onde existir coleta seletiva institucionalizada, os consumidores não poderão descartar os resíduos orgânicos e inorgânicos misturados, assim como serão responsabilizados se descartarem inadequadamente itens previstos na logística reversa.

Nestes últimos quatro anos, participei ativamente dos debates, seminários, palestras e eventos realizados sobre este tema dos resíduos sólidos, inclusive com a publicação de muitos artigos – aqui no Portal EcoDebate são mais de 150 artigos – entrevistas para jornais, rádios, TVs, palestras em várias instituições privadas e públicas, além de assessorar na elaboração de alguns planos municipais e de empresas e desenvolver projetos específicos de educação ambiental, principalmente nas escolas públicas das regiões do Alto da Serra do Botucaraí e Planalto médio no norte do Rio Grande do Sul. Neste sentido, observei diversos avanços e acertos, mas também diversos retrocessos, equívocos e desconhecimentos da PNRS e suas diretrizes.

O principal avanço é sem dúvida a aprovação da PNRS, sua rápida regulamentação e o debate que passou a estimular nos diferentes contextos sociais e econômicos, existindo atualmente uma consciência cidadã muito superior quanto aos problemas relacionados aos resíduos e sua destinação final que antes da legislação. Nos último ano, alguns acordos setoriais importantes para a implantação de sistemas de logística reversa também entraram em discussão através de Editais do Ministério do Meio Ambiente, sendo que alguns já foram assinados (óleos lubrificantes, lâmpadas e embalagens em geral) e terão que ser implementados pelos setores produtivos e poderes públicos, assim como outros que certamente serão assinados. Entre os acordos setoriais obrigatórios à logística reversa estão as pilhas e baterias, pneus, embalagens e resíduos de óleos lubrificantes, lâmpadas fluorescentes e de vapor de sódio e mercúrio, eletroeletrônicos e seus componentes, embalagens e medicamentos de uso humano e veterinário e embalagens de fertilizantes, entre outros. Com a assinatura destes acordos, a cadeia produtiva e de consumo – fabricantes, importadores, distribuidores, comerciantes, serviços públicos de limpeza urbana e consumidores, passam a ter responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida e destino final ambientalmente adequado dos resíduos e produtos obsoletos (Lei 12.305/2010, artigo 30-36).

A organização dos trabalhadores com materiais recicláveis/reutilizáveis, tradicionalmente excluídos das oportunidades econômicas e sociais, em cooperativas e associações e sua consequente profissionalização também é uma característica positiva da PNRS. O Programa Pró-Catador institucionalizado pelo Decreto 7.405/2010 também faz parte dos mecanismos legais originados com a Política Nacional de Resíduos Sólidos para integrar e articular as ações do Estado em relação ao apoio e fomento à organização produtiva , assim como a melhoria das condições de trabalho, inclusão social e ampliação das oportunidades para estes trabalhadores e expansão da coleta seletiva.

Mas quanto à eficiência e práticas concretas de gestão ambientalmente adequada dos resíduos sólidos, a PNRS ainda não produziu resultados ambientais, sociais, econômicos e culturais amplos e expressivos. De acordo com pesquisa da Confederação Nacional dos Municípios – CNM, até o fim do prazo para a elaboração dos planos de gestão dos resíduos sólidos em agosto/2012, somente 9% dos municípios 5.564 municípios brasileiros haviam cumprido esta etapa. Atualmente, a CNM estima que 51% dos municípios elaboraram seus planos, mas que possuem grandes dificuldades para sua implantação, incluindo-se a erradicação dos lixões. Eliézio Alves da Silva, pós-graduado em geografia pela UFPI e do Instituto Venturi do Rio Grande do Sul é mais pessimista e afirmou no 5º Fórum Internacional de Resíduos realizado em São Leopoldo/RS, que atualmente 10% dos municípios estão adequados. Informações do Ministério do Meio Ambiente também demonstram a inadequação de grande parte dos municípios brasileiros. Importante destacar que os resíduos sólidos, além de terem uma política específica, fazem parte das diretrizes nacionais do saneamento básico previstos na Lei 11.445/2007 que estabelece as ações relacionadas ao a) abastecimento de água, b) esgotamento sanitário, c) drenagem e d) manejo dos resíduos. A ausência de planejamento na gestão dos resíduos demonstra que as outras áreas também não estão sendo atendidas.

Quanto ao destino geral dos resíduos no Brasil, em 2012 foram produzidas 62.730,096 toneladas com média de 383,2 kg por habitante e a coleta atingiu 90,7% da população. O crescimento estimado é de 1,3% ao ano. Destes resíduos, 51,4% são orgânicos, 13,5% plásticos diversos, 13,1% caixas longa vida (Tetra Pak) e celulose, 2,9% metais, 2,4% vidros e 16,7% outros resíduos. A destinação final foi respectivamente: 17,8% para lixões sem nenhum controle e/ou tratamento; 24,2% para aterros controlados, em que não existem padrões de segurança quanto aos impactos atuais e futuros dos resíduos que são depositados todos misturados, sem critérios de classificação; 58% para aterros sanitários adequados para disposição final ambientalmente correta. A coleta seletiva atingiu apenas 2,4% dos serviços de coleta, demonstrando desta forma, além do desperdício e envio inadequado para lixões e aterros de resíduos que poderiam transformar-se em matéria prima, uma desarticulação das cooperativas e associações de catadores e da educação ambiental. Os resíduos orgânicos também deveriam ser coletados seletivamente e enviados para compostagem, mas não existem políticas de recuperação e manutenção da fertilidade dos solos que possam estabelecer mercados consolidados para estes produtos. As perdas econômicas relacionadas à ausência de programas amplos, eficientes e eficazes de coleta seletiva chegam a R$ 8 bilhões anuais.

Evidentemente, a ausência de programas de coleta seletiva e compostagem, educação ambiental e valorização dos trabalhadores com materiais recicláveis/reutilizáveis, onera economicamente os municípios que precisam pagar por tonelagem para empresas especializadas na operação de aterros sanitários para depositarem não somente os rejeitos – aproximadamente 15% do volume total – mas todo o volume produzido. Neste sentido, formam-se interesses econômicos que originam relações duvidosas entre estes empreendimentos e os administradores públicos municipais, em alguns casos gerando verdadeiras máfias do lixo e contratos suspeitos, renovados periodicamente, em muitos casos sem licitações e como ações emergenciais de recolhimento e disposição final. Possivelmente, este é um dos principais entraves para a implantação satisfatória da PNRS.

Os municípios diante das responsabilidades (e possíveis penalidades) pretendem a ampliação do prazo para a erradicação dos lixões e com isso o adiamento de todas as outras disposições da Política Nacional de Resíduos Sólidos. O principal argumento é que os prazos foram curtos para a realização de todas as etapas e que para a implantação de programas como a coleta seletiva, por exemplo, são necessárias taxas para cobrir os custos extras. A implantação e operação de aterros também são citadas como obstáculos, sendo estas operações viáveis para os pequenos e médios municípios somente através de consórcios intermunicipais (com no mínimo 100.000 habitantes). O problema para a formação destes consórcios são os interesses políticos e econômicos localizados que dificultam o diálogo, a formação de parcerias e metas comuns. Ou seja, a afirmação “existe um problema orçamentário” é uma meia verdade: existem também problemas políticos, culturais, sociais e econômicos e éticos relacionados com a má gestão dos resíduos sólidos no país. O debate sobre a PNRS tem vinte e três anos e sua aprovação completou quatro no dia 02 de agosto de 2014. Não é possível aceitar que isso seja pouco tempo: é pouco conhecimento e disposição para buscar soluções estruturantes e não imediatistas para os resíduos sólidos.

Desta forma, pode-se afirmar que a Política Nacional de Resíduos Sólidos ainda está no início das soluções definitivas propostas em seus princípios, objetivos, instrumentos, diretrizes e metas. É fundamental que não existam alterações em seus dispositivos, motivadas por interesses ou desconhecimentos, por más ou boas vontades nos processos de implantação da PNRS e que os órgãos institucionais responsáveis e os cidadãos não aceitem deixar para depois o que já deveria ter sido feito (muito) antes. A gestão responsável e compartilhada dos resíduos sólidos orgânicos e inorgânicos produzidos nas diversas atividades humanas.

Referências:

- Municípios ainda não elaboraram Plano de Resíduos Sólidos. Disponível em: http://www.blogdoludwig.com/2014/06/municipios-ainda-nao-elaboraram-plano.html

- Para onde vai o lixo. Elisa Batalha. Revista Radis, nº 139, abril/2014. Disponível em: http://www.ecodebate.com.br/2014/04/07/para-onde-vai-o-lixo/

- Pesquisa aponta que apenas 9% dos municípios fizeram plano de gestão de resíduos. Disponível em: http://www.em.com.br/app/noticia/especiais/rio-mais-20/noticias/2012/08/03/noticias_internas_rio_mais_20,309859/pesquisa-aponta-que-apenas-9-dos-municipios-fizeram-plano-de-gestao-de-residuos.shtml



Antonio Silvio Hendges, Articulista do Portal EcoDebate, professor de Biologia, pós-graduado em Auditorias Ambientais, assessoria em sustentabilidade e educação ambiental (www.cenatecbrasil.blogspot.com.br).

Fonte: EcoDebate

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