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quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Contra a fome, ONU serve comida reciclada

Uma surpresa esperava os governantes de todo o mundo que participaram de um almoço na sede da Organização das Nações Unidas (ONU) durante as sessões da Assembleia Geral, em setembro. O almoço, cujo anfitrião foi o secretário-geral, Ban Ki-moon, um firme defensor da “fome zero”, consistiu em grande parte de alimentos reciclados, resgatados da cozinha antes que fossem parao lixo.


“Cada prato foi preparado com restos que normalmente seriam jogados fora”, disseBan a outro grupo de governantes em uma ceia realizada durante a assembleia anual do Fórum Econômico Mundial, realizado na localidade suíça de Davos entre os dias 20 e 23 deste mês. Um dos aperitivos foi chamado de“salada da lixeira”, contou, acrescentando que foi “um pequeno exemplo de solução sustentável” para erradicar a fome mundial.

Ban, que concluirá seus dez anos de mandato à frente da ONU em dezembro deste ano, realiza uma enérgica campanha pela erradicação da fome extrema até 2030, no contexto dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) adotados pelos países membros das Nações Unidas em setembro de 2015.

O secretário-geral assegurou que mais de um terço dos alimentos do mundo é desperdiçado. “E a eliminação da comida que se desperdiça nas famílias e no campo é um elemento essencial na consecução da fome zero”, o objetivo número dois dos ODS, pontuou. Ban ressaltou que a ONU “está pronta para liderar novas iniciativas em grande escala para acabar com a fome”, e pratica em seu próprio ambiente – e em sua própria cozinha – o que prega ao resto do mundo.

Danielle Nierenberg, presidente da organização FoodTank, com sede em Washington, apontou à IPS que o problema dos resíduos alimentares está muito vigente entre os ativistas em geral e os ambientalistas. “Lamentavelmente, o desperdício de alimentos continua sendo um problema do qual cientistas, pesquisadores, agricultores, empresas, políticos, financistas e investidores, assim como os consumidores, como você e eu, não sabem ou não se preocupam o suficiente”, lamentou.

Segundo Nierenberg, “é parte de nossa tarefa ajudar a mudar isso, dando destaque a algumas das inovações e soluções que estão sendo apresentadas no campo, em cozinhas, supermercados, restaurantes, escolas e laboratórios de todo o país, bem como em prefeituras e nos corredores do Congresso”, afirmou.

Atualmente, são desperdiçados até 40% dos alimentos produzidos nos Estados Unidos. Essa comida seria suficiente para 90 mil pessoas a cada dia. Em todo o mundo são desperdiçadas aproximadamente 1,3 bilhão de toneladas de alimentos porano. Ao mesmo tempo, pelo menos um em cada seis norte-americanos não sabe de onde virá sua próxima refeição, e mais de 800 milhões de pessoas em todo o mundo passam fome, indicouNierenberg.

No Sul em desenvolvimento, pragas, enfermidades e falta de infraestrutura para armazenar e transportar as colheitas impedem que os alimentos cheguem aos mercados ou às mesas dos mais necessitados. No mundo industrializado, os varejistas e os consumidores desperdiçam uma quantidade semelhante ao jogar comida fora.Porém, o desperdício de alimentos não é apenas um problema moral, também é ambiental. A comida desperdiçada nos Estados Unidos é responsável por 5% das suas emissões de gases de efeito estufa (GEE) e de 25% do consumo de água,disse Nierenberg.

Em Davos, Ban afirmou que “recentemente, trabalhadores da ajuda que chegaram à cidade de Madaya, na Síria, nos contaram que ali a população está fraca e frágil devido à severa fome. Uma família entregou seu carro em troca de três quilos de arroz”. Tragicamente, esse desespero se reflete em outras crises em todo o mundo, continuou o secretário-geral, dizendo que “temos a responsabilidade de responder ao clamor das pessoas pelo direito aos alimentos”.

Nierenbergpontuou à IPS que a boa notícia é que as soluções para reduzir as perdas e o desperdício de alimentos podem ser surpreendentemente simples, baratas e benéficas para as empresas. Também podem, ao mesmo tempo, diminuir a fome, a pobreza e a pegada de carbono deixada pela agricultura. A liderança juvenil, as soluções criativas ao desperdício de alimentos e o desenvolvimento empresarial surgem como formas eficazes para combater o desperdício e a perda de alimentos, destacou.

“Creio que algumas das inovações mais interessantes procedem de organizações como a Feedback, que ajudou a organizar o almoço na ONU no ano passado, e que asseguram que dirigentes políticos, agricultores, consumidores e comunidades de financistas e doadores precisam perceber que têm um papel na prevenção da perda e do desperdício de alimentos”, ressaltou Nierenberg.

A ativista acrescentou que existem tantas oportunidades de negócios interessantes para a refrigeração e o armazenamento em pequena escala, a redistribuição de alimentos que de outra forma seriam desperdiçados, e para outras empresas que podem ajudar os agricultores e consumidores a evitar o problema. “Creio que este também é um problema que precisa de grande quantidade de intercâmbio de informação Norte-Sul e Sul-Norte, e que é uma oportunidade para agricultores e empresas de todo o mundo aprenderem uns com os outros”, enfatizou.

Embora os agricultores dos países em desenvolvimento tenham experiência diferente em matéria de armazenamento e refrigeração com relação aos seus pares do mundo industrial, devem lidar com padrões estéticos pouco realistas que frequentemente os obrigam a jogar fora produtos considerados imperfeitos, mas que são absolutamente comestíveis e nutritivos.

Os produtos agrícolas “feios” são uma das maiores oportunidades para os pequenos e grandesagricultores, igualmente, já que podem utilizar essas verduras e frutas para fazer produtos de valor agregado e aumentar a renda e a nutrição, ressaltou a ativista. 

Fonte: Envolverde

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