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terça-feira, 10 de junho de 2014

MMA e MPA querem proibir uso de boto-vermelho e de jacaré como isca

Os ministérios do Meio Ambiente (MMA) e da Pesca e Aquicultura (MPA) vão proibir, por cinco anos, a pesca e comercialização da piracatinga, um peixe liso, conhecido na Amazônia brasileira também como urubu d’água ou douradinha. O objetivo é proteger o boto-vermelho, o jacaré-açu e o jacaretinga, utilizados como isca para captura do piracatinga. A medida deve vigorar a partir de 2015, quando começa a moratória da pesca da piracatinga.


Estima-se que, anualmente, são mortos de 67 a 144 botos-vermelhos para uso na pesca do piracatinga. Essa quantidade está bem acima da taxa natural de mortalidade, estimada em 16 animais ao ano. Isso tem causado uma redução drástica na quantidade de espécimes. Estudo divulgado em 2011 mostrou que, em uma década, a população de botos da Amazônia caiu pela metade.

O problema é tão sério que a matança dos botos e jacarés já está sendo investigada pelo Ministério Público Federal no estado do Amazonas. Ocorre que as populações desses animais vêm sofrendo decréscimos consideráveis desde o final da década de 1990, quando toneladas de piracatinga começaram a ser exportadas para a Colômbia, onde é muito apreciado. Mas, agora, brasileiros das regiões Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste, além do Paraná, também começaram a consumir o peixe.

Grave risco – De acordo com a área técnica do MMA, a pesca da piracatinga é ambientalmente insustentável e economicamente inviável, nas condições atuais, pois a atividade é realizada de forma predatória, com grave risco à sobrevivência de botos e jacarés. Tanto que, com base nos questionamentos e recomendações do Ministério Público, o MMA vem estudando medidas adequadas de controle da atividade, como a instituição da moratória.

Sabe-se que a preferência pelos botos e jacarés deve-se a elevada eficácia das iscas feitas com carne desses animais na captura da piracatinga e ao baixo custo na obtenção de iscas. Os caçadores vendem cada boto ou jacaré por até R$ 50,00, que são transformados em iscas em quantidade suficiente para a pesca de 300 a 600 quilos do piracatinga, o que representa até R$ 600,00 de rentabilidade em uma noite de pesca.

Dados do Plano de Ação Nacional para Conservação dos Mamíferos Aquáticos, o PAN Pequenos Cetáceos, mostram que a reprodução do boto-cor-de-rosa, ou boto-vermelho, está fortemente associada ao ciclo das águas da região. O processo reprodutivo ocorre entre os meses de maio e setembro, no final do período da cheia e durante a vazante na Amazônia central.

Fragilidade - Sobre a necessidade de preservar esses animais, o gerente de Biodiversidade Aquática do MMA, Roberto Ribas Gallucci, explica que os botos “possuem papel fundamental no equilíbrio ecológico de ecossistemas aquáticos da Amazônia, como predadores de topo na cadeia alimentar e que contribuem para a saúde dos estoques ao eliminar os indivíduos mais frágeis”. Além disso, têm importância marcante na geração de renda e na economia local, por meio do turismo sustentável, a exemplo do turismo interativo. Esse trabalho é feito com botos no Parque Nacional de Anavilhanas em parceria com a Universidade Federal do Amazonas, Associação de Turismo de Novo Airão, Flutuante dos Botos, Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Biodiversidade Amazônica Parque e Reserva Extrativista do Rio Unini.

Segundo Roberto Gallucci, os mamíferos aquáticos são especialmente vulneráveis a ameaças devido às suas baixas taxas de natalidade, da lenta maturação sexual, dos intervalos longos entre cada cria, gerando apenas um filhote por vez. Por isso mesmo, “os botos são espécies críticas nos ecossistemas aquáticos da Bacia do Rio Amazonas, não só como predadores de topo, mas também como elementos significativos das culturas e tradições de muitos grupos indígenas em toda a bacia”. O uso do boto-vermelho na pesca tem contribuído para a redução de cerca de 10% ao ano das populações nativas do mamífero, colocando o animal em risco de extinção.

Dados técnicos mostram que, entre os botos-vermelhos, os machos adultos são bem maiores e mais robustos que as fêmeas, podendo chegar a 2,55 metros de comprimento e 200 quilos de peso. As fêmeas, que atingem 2,25 metros e até 155 quilos, têm gestação de aproximadamente 11 meses. O único filhote nasce com pelo menos 80 centímetros de comprimento e permanece com a mãe por pelo menos três anos. O intervalo mínimo entre os nascimentos, quando não ocorre a perda do filhote, é estimado em cerca de três anos. A fêmea engravida novamente no final do segundo ano de amamentação.

Moratória - Os especialistas querem que o governo defina normas, critérios, padrões e medidas para a pesca da piracatinga, fixando áreas, épocas, equipamentos, petrechos adequados à pesca e tamanho mínimo do pescado, avaliando, inclusive, a necessidade de se estabelecer um período de defeso. Roberto Galluci conta que o MMA, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) recomendam que a moratória da pesca e comercialização da piracatinga seja estabelecida por tempo indeterminado, “com base na necessidade urgente de se coibir uma prática disseminada que tem promovido a matança intensiva de botos cor-de-rosa, além de botos-tucuxi e dos jacaré-açu e jacaretinga”.

Além da proibição, o MMA recomenda a implementação de um conjunto de medidas para o controle, fiscalização, capacitação para atividades produtivas sustentáveis e divulgação da legislação da proteção aos botos, de forma a garantir resultados mais amplos e duradouros. O objetivo é “combater a atividade ilegal, com resultados positivos não apenas para o meio ambiente, mas também para a economia das comunidades locais, demonstrando o firme interesse do Brasil em proteger essa espécie, símbolo da Amazônia, patrimônio da fauna e da diversidade biológica da região, além de defender a atividade pesqueira tradicional, realizada de forma legal e sustentável pelos povos da Amazônia”, esclarece Roberto Gallucci.

Filhotes - De acordo com a Associação Amigos do Peixe-boi (Ampa), localizada no Amazonas, as características da espécie contribuem para a vulnerabilidade desse mamífero amazônico. As fêmeas têm gestação de dez meses e cuidam dos filhotes por até quatro anos, ou seja, a inserção de outro boto na natureza é demorada.

Segundo o Ministério da Pesca, a moratória da piracatinga vai resguardar a subsistência do pescador artesanal, que ficará autorizado a capturar até cinco quilos por dia para o consumo familiar. 

Fonte: MMA

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