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terça-feira, 9 de agosto de 2016

Desastres lentos e graduais, artigo de Carlos Augusto de Medeiros Filho

Desastres ambientais, de causas naturais ou antrópicas, que ocorrem de maneira brusca, violenta, motivam, normalmente, fortes divulgações na imprensa, especialmente se estiverem associadas com significativas tragédias humanas.
Existem outros desastres, entretanto, que por se desenvolverem paulatinamente, por um relativo longo período de tempo, não chegam com destaque na imprensa e, em alguns casos, não são classificados como um sinistro ou não tem seus motivos devidamente discutidas.

Recebi, recentemente, uma mensagem com uma reportagem proveniente do Estado do Acre, que exemplificava um caso de desastre ambiental lento e gradual. O site Contilnet noticiava que “100% dos afluentes do Rio Acre, assim como dos igarapés Judia e São Francisco, estão contaminados por agrotóxicos, agroquímicos, esgoto humano e lixo”. Já o jornalista Pitter Lucena, em uma crônica de 06/08/2007, afirmava que “ em julho de 2002 em extensa reportagem publicada no jornal A Gazeta, de Rio Branco, alertei que o rio Acre poderia desaparecer nos próximos 15 anos. A projeção baseava-se em estudos de especialistas que, há algum tempo, questionam a falta de política de conservação das bacias hidrográficas e de um programa sério de despoluição do rio por parte dos governos locais e entidades ambientalistas. E as projeções vão se confirmando”.

Em Natal, o desastre da contaminação por nitrato das águas superficiais e subterrâneas é outro caso exemplar de sinistro ambiental que avança constante e silenciosamente e sem expectativa clara de solução. O jornal Tribuna do Norte de 17 de março de 2013, por exemplo, reportava que “do total de 131 poços perfurados pela Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte (Caern) em Natal, mais de 30 estavam contaminados por nitrato”.

Com o crescimento urbano acelerado, a partir principalmente da década de 80, a qualidade da água disponível ao natalense foi se deteriorando com as constantes notícias de contaminação da água fornecida à população. Cabral et al. (2009) afirmam que apesar da importância que as águas subterrâneas representam para o abastecimento da cidade de Natal, sua qualidade, a cada dia, se dete­riora em decorrência das crescentes atividades urbanas. Righetto & Rocha (2005) relatam que dentre as ativi­dades mais impactantes, destaca-se a infiltração no solo de águas servi­das das fossas e sumidouros, pois cerca de 70% dos esgotos domésticos produzidos são lançados no subsolo.

Nem as águas minerais, comercializadas para a população beber, estão imunes a essa contaminação. Pesquisas registram exemplos de águas minerais comercializadas, em Natal, com resultados não recomendáveis de nitrato ou com representativos indícios de processos contaminantes desse parâmetro químico (Rodrigues et al. 2009; Nóbrega et al. 2008).

A explicação para esse rápido, desastroso e crescente processo de contaminação das águas subterrâneas de Natal tem relação direta com a característica do nosso principal reservatório hidrogeológico, o Aquífero Barreiras, que nos nutria, há tempos, da mais pura água e que hoje se encontra, em grande parte, poluído em decorrência de nocivas práticas antropogênicas. O Aquífero Barreiras, em termos litológicos, é constituído por arenitos finos e argilosos na porção superior e arenitos mais gros­seiros na porção inferior. Estudo realizado por Melo (1995) mostra que o sistema hidráulico do Barreiras se comporta, no geral, como livre a localizadamente semiconfinado.

Essas características de aquífero livre a semiconfinado é que torna o Barreiras bastante vulnerável em captar cargas de contaminantes. Isso é ainda agravado pela sua relativa proximidade com a superfície. Explica-se, assim, essa ampla, silenciosa, mas tecnicamente indiscutível calamidade ambiental.

A preservação desse rico, porém frágil bem mineral seria, em um mundo civilizado, uma prática lógica e obrigatória de qualquer gerenciamento político. Infelizmente não é o que parece acontecer aqui.

Referência Bibliográfica

Cabral, N. T.; Righetto, A. M.; Queiroz, M. A. 2009. Comportamento do nitrato em poços do aquífero Dunas / Barreiras nas explotações Dunas e Planalto, Natal, RN, Brasil. Eng Sanit Ambient | v.14 n.3 | jul/set 2009 | 299-306.

MELO, J.G. 1995. Impactos do desenvolvimento urbano nas águas subterrâneas de Natal, RN. 195 f. Tese (Doutorado em Geologia) – Instituto de Geociências, Universidade de São Paulo, São Paulo,

Nóbrega, M. M. S.; Araújo, A. L. C.; Santos, J. P. Avaliação das concentrações de nitrato nas águas minerais produzidas na região da Grande Natal. Revista Holos. Vol. 3. 2008. 4-25 p.

Righetto, A.M.; Rocha, M. Exploração sustentada do aqüífero Dunas/Barreiras na Cidade de Natal, RN. Revista Brasileira de Recursos Hídricos, v. 10, n. 2, p. 27-38, 2005.

Rodrigues, M; Pereira, R.; Mayer, A.; Magalhães, D. R. M.; Fernandes Jr., J. R. A atual situação da contaminação por nitrato nos poços da cidade de Natal/RN: o caso das águas minerais. IV Congresso de Pesquisa e Inovação da Rede Norte e Nordeste de Educação Tecnológica. Belém – Pa. 2009.

Carlos Augusto de Medeiros Filho, geoquímico, graduado na faculdade de geologia da UFRN e com mestrado na UFPA. Trabalha há mais de 30 anos em Pesquisa Mineral.

Fonte: EcoDebate

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