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quinta-feira, 15 de março de 2018

Por que aprovar empreendimentos de impacto negativo no Litoral? artigo de Junior Ruiz Garcia

A Fundação SOS Mata Atlântica e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) lançaram, em fevereiro, um mapeamento da região litorânea do Brasil: o Atlas da Costa Atlântica.
O estudo avaliou os ecossistemas costeiros de 14 estados brasileiros que abrigam o bioma Mata Atlântica. Os resultados mostraram que o Paraná concentra importantes remanescentes de ecossistemas de mangues e restinga, somando mais de 133 mil hectares de um total de 871 mil hectares remanescentes no Brasil. Apesar de sua importância ambiental, sociocultural e econômica, esses remanescentes estão ameaçados por uma proposta em curso para o Litoral do Paraná, capitaneada pelo governo do estado em parceria com o setor privado.

A contribuição dos ecossistemas para a qualidade de vida das pessoas é amplamente reconhecida. Desse modo, pressupõe-se que os resultados de um plano de desenvolvimento devam contribuir para a melhoria da qualidade de vida das pessoas, o que inclui a preservação, recuperação ou ampliação da qualidade dos ecossistemas. Neste sentido, o que pensar de dois empreendimentos previstos – a Faixa de Infraestrutura e o Terminal Portuário de Pontal do Paraná (TPPP) – para o município de Pontal do Paraná e cujos Relatórios de Impacto Ambiental (Rima) apontam mais de 170 impactos negativos? Será que esses empreendimentos podem realmente contribuir para a melhoria da qualidade de vida da população de Pontal do Paraná? Quais os reais efeitos desses impactos negativos para a qualidade de vida da população e o turismo na região?

O Rima da Faixa de Infraestrutura aponta pelo menos 33 impactos socioambientais negativos. Cabe destacar que só esse empreendimento custará à sociedade paranaense R$ 369 milhões. Os impactos incluem: piora da qualidade do ar; aumento do nível de ruídos; contaminação do solo; redução da qualidade das águas superficiais; desmatamento de remanescentes de Mata Atlântica; transtornos devido ao aumento da população masculina; redução da qualidade de vida do pescador; e redução dos recursos pesqueiros. Em outras palavras, o governo do estado do Paraná aplicará R$ 369 milhões – dinheiro que poderia ir para investimentos em saúde, segurança e educação – para impor 33 impactos negativos à comunidade de Pontal do Paraná. Será esta uma boa aplicação dos já escassos recursos públicos? Não existem alternativas mais coerentes que possam proporcionar uma real melhoria da qualidade de vida da população de Pontal do Paraná?

O Rima do Terminal Portuário de Pontal do Paraná (TPPP), o Porto Pontal, destaca a ocorrência de mais de 140 impactos socioambientais negativos, como remoção da população residente na área do empreendimento; inibição de novos investimentos em turismo devido às atividades portuárias e da afluência de turistas; prejuízos a demandantes e proprietários frágeis pelo encarecimento dos imóveis; redução da disponibilidade de água subterrânea de boa qualidade; redução da qualidade e transparência das águas estuarinas; aumento do ruído na área costeira (terrestre e marítima); aumento da concentração de gases e partículas atmosféricas; danos à comunidade de peixes; contaminação dos recursos pesqueiros; aumento do trabalho infanto-juvenil; aumento das ocupações irregulares; piora da qualidade de vida das pessoas; redução da renda dos pescadores e piora das condições de trafegabilidade na região em função do aumento do fluxo de caminhões, estimado em 388 por dia já no primeiro ano de operação do terminal. Esse número, no entanto, não leva em consideração os demais empreendimentos em processo de licenciamento na região, tais como a ampliação da Techint, a instalação da Melport/Catallini, da Odebrecht e da Subsea 7, que irão aumentar de maneira abusiva esse fluxo.

Cabe ressaltar, ainda, que o número de vítimas em acidentes de trânsito em Pontal do Paraná foi de oito vítimas por 100 mil habitantes em 2015, enquanto que no mesmo período, em Paranaguá, o índice foi de 331, segundo dados do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes). Qual o impacto no número de vítimas em acidentes de trânsito decorrentes de tamanho aumento no fluxo de caminhões pesados em Pontal do Paraná? Importante refletir.

Esse conjunto de prejuízos apresentados nos relatórios de impacto ambiental de ambos os empreendimentos representam altíssimo custo para a população e para os turistas de Pontal do Paraná apenas para terem acesso ao modelo de desenvolvimento defendido pelo governo do estado e por investidores privados financiados, em parte, por recursos públicos.

Será que a comunidade local e os turistas tiveram conhecimento desses impactos negativos decorrentes da realização dos empreendimentos? E a sociedade paranaense, que financiará parte desses investimentos com recursos públicos, foi de fato ouvida ou convidada a participar do debate? Certamente que não.

Parece-nos bastante contraditório um plano de desenvolvimento impor mais de 170 impactos negativos em nome da “melhoria da qualidade de vida” da população local e dos próprios turistas. Por que os recursos públicos, da ordem de R$ 369 milhões, destinados apenas à construção da Faixa de Infraestrutura não são aplicados em melhorias diretas da qualidade de vida da população e dos turistas de Pontal do Paraná?

Os efeitos positivos desses investimentos seriam imediatos sobre a qualidade de vida da população, além de estimular fortemente o turismo na região. Questionar quais são os interesses envolvidos na realização de ambos os empreendimentos em detrimento da comunidade de Pontal do Paraná e seus turistas, a quem serão impostos imensos custos sociais e públicos, é dever da sociedade. Vamos começar?

Junior Ruiz Garcia, doutor em Desenvolvimento Econômico, Espaço e Meio Ambiente, é professor do Departamento de Economia da UFPR, diretor-executivo da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica, membro do Observatório de Conservação Costeira do Paraná (OC2) e parceiro do Observatório de Justiça e Conservação (OJC).

* Artigo enviado pelo Autor e originalmente publicado no Jornal Gazeta do Povo, do estado do Paraná.


Fonte: EcoDebate

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