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quinta-feira, 10 de julho de 2014

Tragédia nacional? artigo de Montserrat Martins

Olha só como o mundo ficou diferente agora, desde aquela meia hora em que o Brasil tomou os primeiros 5 gols da Alemanha, em que os comentaristas de TV passaram a falar em “vexame”, “humilhação” e até em “tragédia”. Não é só a seleção brasileira que tem de ser revista, mas a nossa cultura como um todo, nosso conceito de sociedade e de país. Quando o esporte é mais do que deveria, é porque nos faltam outros valores. A verdadeira “goleada” que estamos tomando dos países mais organizados é nos nossos níveis de educação e de cultura, por exemplo.


Tragédia mesmo foram as mortes no viaduto que desabou em Belo Horizonte e dos operários que morreram durante as obras de última hora para a Copa. Vexame mesmo foi a torcida brasileira vaiar o hino dos outros países. Humilhante é saber que não se podia falar de assuntos sérios porque quem falasse do mundo real, ao invés do oba-oba da Copa, seria visto como um “agourento”, quase um traidor nacional.

Seria oportunismo político da oposição jogar na conta do governo todos os males do país, tanto quando o governo querer “faturar” votos com a Copa. A verdade é que temos uma (falta de) cultura política de cinco séculos, onde tudo fica para a última hora, tudo é improvisado. Não li nenhuma notícia sobre as mortes em obras durante as Copas em outros países, ao contrário do farto material sobre jogos em Copas anteriores. Numa cultura festiva, falar de assuntos sérios, apurar responsabilidades, seria ser “estraga-prazeres”. Também não ouvi falar da presença de prefeitos, governadores ou presidenta no enterro das vítimas, só se discutia a presença de autoridades nos estádios.

Voltamos agora ao mundo real onde “o suor faz mágica” como dizia o anúncio mais lúcido que passou na TV durante a Copa. Os germânicos se prepararam para a Copa, chegaram a construir todo um complexo para os seus treinamentos aqui no Brasil, enquanto nós vivíamos de oba-oba e badalação de jogadores sem treinos, movidos a palestras motivacionais. Os choros eram de superação, eles venciam na vontade, acima de suas condições futebolísticas.

Futebol devia ser só um esporte e congraçamento, falta senso de ridículo quando se diz que ser goleado é uma “tragédia”, falta noção de coisas mais importantes na vida. Tanto que os próprios alemães não comemoraram a goleada, ficaram sensibilizados com a decepção dos anfitriões, não estávamos em guerra com eles, mas sim praticando um esporte. Sim, o futebol é mágico porque nos transporta para um mundo próprio fascinante, mas terminado o jogo cada um volta para a sua vida real. Para o Brasil que quer trabalhar, estudar, se desenvolver, ser mais civilizado e não só festivo, essa goleada pode ser uma oportunidade, quase uma benção, porque a derrota traz lições quer se queira, quer não.

O que acontece no mundo do futebol é uma bela metáfora para as outras áreas da vida: a preparação dá de goleada na improvisação, superstição não ganha jogo, verdadeiros vencedores não se fazem da noite para o dia. Na Copa de 1970 o Brasil passou quarenta dias se preparando no México, porque se sentira humilhado em 1966, quando foi eliminado na primeira fase. Esse ano se juntaram as pessoas em duas semanas e os treinamentos foram raros.

O que é realmente importante não é a falta de preparação da seleção. É a falta de preparação do país para os verdadeiros desafios do século XXI. E eles são muitos, e tão importantes que não cabem aqui nessa reflexão sobre nossa (falta de) cultura.

Montserrat Martins, Colunista do Portal EcoDebate, é Psiquiatra.

Fonte: EcoDebate

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