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segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Que caminhos seguir nesta crise planetária? artigo de Washington Novaes

É um susto ler a notícia (BBC News, 22/10) de que a experiente, cautelosa secretária executiva da Convenção do Clima (ONU), Christiana Figueres, ao ser entrevistada pela rede de televisão BBC, perdeu o controle e desabou em pranto incontido após afirmar que a falta de acordo global para conter emissões que contribuem para mudanças climáticas “está condenando as futuras gerações antes mesmo que elas nasçam”. Isso, a seu ver, “é absolutamente injusto e imoral”. Se nem uma diplomata no mais alto nível consegue ocultar a emoção e cai no choro, que pensarão os cidadãos no mundo todo – ainda que ela diga não perder a esperança num acordo global (em Paris, 2015) para conter emissões, porque estamos “nos movendo lentamente, mas na direção certa”?


A entrevista ocorreu poucos dias depois de 800 mil pessoas haverem sido retiradas de suas casas no Estado indiano de Odisha, ameaçadas por um ciclone (The New York Times, 13/10). E de esse mesmo jornal haver publicado (Estado, 15/10) que um quarto dos seres humanos (mais de 1,5 bilhão de pessoas) está “em risco”, principalmente a população de países “à beira do Golfo de Bengala” (incluindo Índia, Bangladesh, Sri Lanka, Mianmar, Tailândia, Malásia e Sumatra), por causa dos chamados “eventos climáticos”.

Mas, como disse Christiana Figueres, as negociações caminham – quando caminham – muito lentamente. No ano passado, segundo a Agência Internacional de Energia, o financiamento de projetos que reduzam emissões não passaram de 60% do que a Convenção do Clima considera o mínimo necessário para conter o aumento da temperatura do planeta em 2 graus Celsius. Até 2020 seriam indispensáveis US$ 5 trilhões. E ao longo de mais tempo só o setor de energia precisará investir US$ 19 trilhões.

E nós, por aqui? Diz o cientista José Marengo, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), um dos mais informados sobre clima – foi um dos autores do Quinto Relatório de Avaliação do Painel do Clima (IPCC) -, que nos últimos cinco anos o Brasil assumiu “um padrão de poluidor de Primeiro Mundo” (O Eco, 10/10). O desmatamento caiu e a causa maior das emissões está na queima de combustíveis fósseis, em especial por veículos. Mas a agricultura, a indústria e as termoelétricas, principalmente, também contribuem. E o Grupo de Trabalho sobre Clima do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais, em ofício ao Senado, alerta que o processo de revisão do Plano Nacional sobre Mudança do Clima, coordenado pela Casa Civil da Presidência, se encontra “completamente prejudicado e fadado a um grande insucesso”. A boa notícia é que o cientista Carlos Nobre, também do Inpe e do Ministério da Ciência e Tecnologia, foi convidado a integrar o Painel de Alto Nível sobre Sustentabilidade Global, que assessora o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon (FP, 17/10). Quem sabe de lá não conseguirá influenciar nossos padrões governamentais na área do clima?

Não é só nessa área que se sucedem notícias preocupantes em âmbito mundial. Estudo do Crédit Suisse (Ethos, 24/10), um dos maiores grupos financeiros internacionais, diz que o nível de concentração de renda é espantoso, já que 0,7% da população global (menos de 50 milhões de pessoas) detém 41% da riqueza mundial total, que é de US$ 241 trilhões (ficam com US$ 98,7 trilhões). Se a riqueza mundial fosse dividida igualmente, seriam US$ 51,6 mil para cada pessoa. Mas o Brasil está no grupo de países com renda média entre US$ 5 mil e US$ 25 mil. A Austrália é o país com riqueza mais bem distribuída (US$ 219 mil per capita). E os EUA, com o maior produto interno bruto, “têm um dos maiores índices de pobreza e desigualdade do mundo”.

O quadro é ainda mais forte quando se foca a questão dos alimentos. Mark Bittman, do jornal The New York Times (Estado, 22/10), depois de relembrar que quase 1 bilhão de pessoas passa fome, acentua que produzimos calorias suficientes para todas (2,7 mil diárias para cada uma), mas um terço serve para alimentar animais, 5% são usados na produção de biocombustíveis e “um terço é desperdiçado ao longo da cadeia alimentar”.

Se aproximarmos os olhos da África veremos que só no Congo (antigo Zaire), “em quase duas décadas, os confrontos no leste do país deixaram cerca de 6 milhões mortos” (equivalentes a mais de metade da população da cidade de São Paulo), no “mais sangrento confronto” desde a 2.ª Guerra Mundial (Estado, 20/10). Principalmente entre etnias como tutsis e hutus, que, deslocadas pelos antigos colonizadores (que buscavam minérios), hoje se matam na disputa por áreas mais favoráveis em termos de recursos naturais, principalmente água e terra para plantar.

Mas não adianta só ficarmos inconformados. É preciso propor e obrigar legisladores, em todos os níveis, a aprovar regras, padrões adequados para tudo. E criar ônus financeiros para quem os desrespeitar. Nos licenciamentos urbanos, por exemplo, de forma a evitar “ilhas de calor”, adensamentos do tráfego, aumento da poluição do ar e de seus custos na vida das pessoas e na área de saúde. Na imposição de critérios rígidos para evitar a poluição do ar, detectar donos de veículos infratores na inspeção veicular obrigatória, puni-los. Impedir a remoção de biomas e fragmentos de vegetação que levem a aumentos de temperatura, mudanças do clima. Coibir formatos e dimensões inadequados na agropecuária. Também nas emissões de poluentes industriais. Obrigar governos, empreendedores, geradores e distribuidores de energia e cidadãos a seguir um modelo de eficiência energética e redução acentuada de poluentes. Impedir a deposição de esgotos sem tratamento nos recursos hídricos. Eliminar lixões. Etc., etc.

Não há tempo a perder. Já temos problemas até com lixo espacial. E vamos começar a buscar recursos em outros corpos celestes.

*Washington Novaes é jornalista. E-mail: wlrnovaes@uol.com.br

Fonte: EcoDebate

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