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terça-feira, 5 de novembro de 2013

Unesp e MIT desenvolvem sensor de gás tóxico

Pesquisadores do Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Araraquara, em parceria com colegas do Departamento de Ciência e Engenharia de Materiais do Massachusetts Institute of Technology (MIT), Estados Unidos, desenvolveram um material à base de óxido de estanho (SnO) com capacidade de detectar dióxido de nitrogênio (NO2) muito maior do que os sensores químicos já usados para identificar esse tipo de gás altamente tóxico, formado nas reações de combustão dos motores dos veículos.


Desenvolvido por meio de um projeto apoiado no âmbito de um acordo com o MIT, o material deverá resultar em uma patente compartilhada pelas duas instituições e foi descrito em um artigo publicado na edição de setembro da revista Sensors and Actuators B: Chemical.

“Enquanto a resistência elétrica dos materiais puros utilizados atualmente para detectar dióxido de nitrogênio aumenta entre 50 e 70 vezes na presença do gás tóxico, a do sensor que desenvolvemos apresenta um aumento de mil vezes. Esse é o sinal que utilizamos para medir a capacidade de detecção de um sensor”, disse Marcelo Ornaghi Orlandi, professor do Instituto de Química da Unesp de Araraquara e um dos autores do estudo, à Agência FAPESP. O projeto é coordenado por José Arana Varela, professor do IQ-Unesp e diretor-presidente do Conselho Técnico-Administrativo da FAPESP. 

O material desenvolvido pelos pesquisadores consiste em discos cristalinos de óxido de estanho – semelhantes a confetes de papel – em escala micrométrica (milionésima parte do metro).

Para desenvolver o material, eles utilizaram um processo chamado de redução carbotérmica, por meio do qual sintetizaram os discos na forma de óxido de estanho II, em vez da forma tradicional do óxido metálico – o dióxido de estanho IV (SnO2).

Ao mesmo tempo, conseguiram manter a estabilidade térmica e química, preservar a estrutura e fazer com que o material apresentasse maior sensibilidade ao dióxido de nitrogênio do que o SnO2 – um dos materiais mais estudados atualmente para aplicação como sensor do gás tóxico.

“O óxido de estanho é difícil de ser sintetizado porque é termicamente instável e, a temperaturas acima de 400 ºC, tende a se decompor”, explicou Orlandi. “Por meio de um controle fino, conseguimos pela primeira vez sintetizá-lo e, ao mesmo tempo, estabilizar suas propriedades térmicas e químicas e aumentar sua resposta sensora.”

Seletividade

O material foi exposto em uma câmara a diferentes tipos de gases tóxicos – como o gás carbônico (CO2) e metano (CH4), além do dióxido de nitrogênio – em temperaturas entre 100 ºC e 350 ºC. Os pesquisadores observaram que o material apresenta excelente seletividade e sensibilidade ao dióxido de nitrogênio principalmente a 200 ºC – faixa bem abaixo da temperatura de transição de decomposição do material, de 400 ºC.

Nesse nível de temperatura, a resistência elétrica do sensor aumentou mil vezes quando o material foi exposto a 100 partes por milhão (ppm) de dióxido de nitrogênio diluído em ar sintético – que simula a atmosfera.

Além disso, os discos de óxido de estanho apresentaram capacidade de seletividade do dióxido de nitrogênio 100 vezes superior à demonstrada para outros tipos de gases tóxicos, como o gás carbônico e o metano, disseram os pesquisadores.

“Não encontramos na literatura científica outro sensor de dióxido de nitrogênio com seletividade e sensibilidade tão alta e dessa ordem de grandeza”, afirmou Orlandi.

De acordo com o pesquisador, uma das razões pelas quais os discos de óxido de estanho apresentam alta sensibilidade e seletividade ao dióxido de nitrogênio é que são semicondutores do tipo N – materiais que, a exemplo do óxido de zinco (ZnO) e do dióxido de titânio (TiO2), apresentam excesso de elétrons em sua estrutura e conferem condutividade elétrica parcial. O dióxido de nitrogênio, por sua vez, tem predisposição a trocar elétrons com o material.

Por causa disso, ao aderir à superfície dos discos de óxido de estanho, as moléculas de dióxido de nitrogênio aprisionam os elétrons livres e aumentam a resistência elétrica dos discos de óxido de estanho.

“Quando o dióxido de nitrogênio adere à superfície dos discos de óxido de estanho, ele aumenta mil vezes a resistência elétrica do material, como pudemos medir e observar nos experimentos”, disse Orlandi.

Ao retirar o dióxido de nitrogênio da câmara na qual os discos de óxido de estanho foram colocados e, consequentemente, quando o gás saía da superfície do material, os pesquisadores constataram que a resistência inicial do sensor químico retornava rapidamente para os mesmos patamares nos quais se encontrava antes de ser exposto ao gás.

“Vimos que o sensor é muito sensível e seletivo especificamente para o dióxido de nitrogênio, características muito importantes para um sensor”, afirmou Orlandi. “Se um sensor for seletivo e sensível para todos os tipos de gases poluentes, ele não funciona para essa finalidade”, avaliou.

Superfície virgem

O pesquisador ressalta que o aumento de mil vezes na resistência elétrica dos discos de óxido de estanho e, consequentemente, do sinal de detecção que observaram, foi obtido sem nenhum tipo de modificação na superfície do material – como se faz usualmente para aumentar a capacidade de detecção de dióxido de nitrogênio por outros tipos de sensores químicos já existentes, como aqueles à base de dióxido de estanho IV.

Com base nessa constatação, os pesquisadores estão fazendo melhorias na superfície dos discos para aumentar ainda mais a alteração da resistência elétrica do material quando exposto ao NO2.

“Em vez de mil vezes, como já conseguimos hoje, queremos aumentar o sinal do sensor para 2 mil”, contou Orlandi. “O sinal dos sensores à base de dióxido de estanho IV puro está entre 50 e 70 vezes, o que já é considerado muito bom.”

Os pesquisadores também desenvolveram fitas de óxido de estanho em escala nanométrica (bilionésima parte do metro), intuindo que os resultados de seletividade e sensibilidade ao dióxido de nitrogênio por essas nanofitas seriam maiores do que os obtidos em escala micrométrica.

Ao comparar os materiais nas duas escalas, no entanto, constataram que os resultados apresentados pelos discos em escala micrométrica foram melhores do que os do sensor em escala nanométrica.

De acordo com Orlandi, essa diferença de desempenho do material ocorre porque os discos apresentam uma morfologia privilegiada em comparação com as nanofitas. Por possuir grandes superfícies, as duas faces paralelas dos discos apresentam alta concentração de elétrons desemparelhados, que podem ser mais facilmente doados às moléculas de dióxido de nitrogênio.

“Acreditamos que é essa superfície do material, com alta concentração de elétrons desemparelhados, que leva a respostas melhores em termos de seletividade e sensibilidade ao dióxido de nitrogênio em escala micrométrica do que na forma nanométrica”, disse Orlandi.

Na avaliação do pesquisador, o estudo corrobora os resultados de outras pesquisas internacionais publicadas nos últimos anos, demonstrando que muitas vezes materiais em escala micrométrica podem apresentar um desempenho melhor do que na escala nanométrica.

Ainda não se sabe, contudo, porque o material tem o formato de confete de papel. “O mecanismo de crescimento desse material ainda é uma incógnita”, afirmou Orlandi.

Parceria com o MIT

O novo sensor foi desenvolvido nos laboratórios do Departamento de Físico-Química da Unesp de Araraquara.

Por meio da parceria estabelecida pelos pesquisadores brasileiros com os colegas do MIT, Orlandi e o estudante Anderson André Felix – que atualmente realiza pós-doutorado com Bolsa da FAPESP e também é um dos autores do estudo – passaram uma temporada na universidade norte-americana, onde realizaram testes e avaliaram as propriedades sensoras do novo material.

Por meio de um sistema analítico disponível no MIT – no qual é possível medir ao mesmo tempo até oito amostras do material, sob a mesma temperatura e fluxo de gás –, os pesquisadores constataram a capacidade de o material detectar dióxido de nitrogênio em níveis muito maiores aos observados pelos sensores de dióxido de estanho IV.

Devido aos resultados excepcionais apresentados pelo novo material, o professor Harry Tuller, do Departamento de Ciência e Engenharia de Materiais do MIT, concluiu que o sensor deveria ser patenteado e solicitou que o escritório de propriedade intelectual da universidade norte-americana se encarregasse de fazer isso.

“Mais do que apenas uma observação científica interessante, tornou-se claro para nós que o material desenvolvido durante esse trabalho colaborativo poderia se tornar um divisor de águas na tecnologia de sensor”, disse Tuller.

“No MIT, somos incentivados a solicitar patentes de projetos como esse, porque isso atinge vários objetivos: serve para sensibilizar cientistas e engenheiros da instituição a pensar em como um desenvolvimento pode ter impactos na sociedade e para chamar a atenção da indústria para esses novos conceitos tecnológicos que podem passar despercebidos porque não leem ou não compreendem a literatura científica”, avaliou.

A patente foi depositada em caráter provisório no Escritório de Marcas e Patentes dos Estados Unidos (USPTO, na sigla em inglês).

Em maio de 2014, o pedido de patente no escritório norte-americano deverá ser convertido para definitivo e, após ser concedida nos Estados Unidos, a Agência Unesp de Inovação (Auin) também deverá requerer o depósito no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), no Brasil.

“Em 2014 deveremos ter os pedidos de patente do material tanto nos Estados Unidos como no Brasil”, disse Fabíola Spiandorello, gerente de propriedade intelectual da Auin.

O artigo Giant Chemo-Resistance of SnO disk-like structures (doi: 10.1016/j.snb.2013.05.087), de Orlandi e outros, pode ser lido na revista Sensors and Actuators B: Chemical em www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0925400513006709. 

Fonte: Fapesp

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